Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores,
Lisboa com suas casas
De várias cores...
À força de diferente, isto é monótono.
Como à força de sentir, fico só a pensar.

Se de noite, deitado mas desperto,
Na lucidez inútil de não poder dormir,
Quero imaginar qualquer coisa
E surge sempre outra (porque há sono
E, porque há sono, um bocado de sonho),
Quero alongar a vista com que imagino
Por grandes palmares fantásticos,
Mas não vejo mais,
Contra uma espécie de lado de dentro das pálpebras,
Que Lisboa com suas casas
De várias cores.

Sorrio, porque ali deitado é outra coisa.
À força de monótono, é diferente.
E, à força de ser eu, durmo e esqueço que existo.

Fico só, sem mim, que esqueci porque durmo,
Lisboa com suas casas
De várias cores.

                          Fernando Pessoa (Álvaro de Campos)

« Voltar