DIÁRIO DE UM SUJEITO

não tive tanta certeza desde que deixei de ser menino
foi um dia onde pássaros voavam sobre minha cabeça
quando fazia raios de bicicleta com chicletes
amarrava meu cachorro em libélulas que o levavam
pra lugar que nem cachorro botaria defeito
esse foi meu erro
casar coisas que voam com pêlos e afins
tenham dó de mim
não sei sequer nadar
 

às oito horas começavam os lampejos
coisas de grilos pulando em sapos
algazarra de gorjeios
latidos e latas batendo no meu pulmão
dia e noite a mesma canção
teu pai não vem mais
tua mãe
tua mãe

brilhou na árvore um besouro
desses de capotão
bicho merda de chifre de pedra
furando o pau e traindo a noite
com sua casca preta parecendo casa de coruja

ah deixei lá sim meus pedaços de mim
minha vó desandou a ficar doida
nadava pelada e comia moita
apesar dos seus dentes verdes
ela nunca deixou de sorrir
até morrer até vazar e dormir pra sempre
no canteiro frente ao portão
rugas que lembravam mãos
uma cara que já nascera velha pro meu coração

Carlos Eduardo

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