A PALAVRA E O SUJEITO

eu olhei pro pavão
meu primo falou:
as penas dele
no sol são verdes
na sombra azuis
eu disse então:
larga de ser burrão
as penas deles são verduis

os ovos de tartaruga
nascem moles
depois ficam duros
e há pouca coisa que os fure
assim eles são em sua vida
dules

perguntaram:
ocê tá endoidado?
eu disse: não
sei
só sei que o que vemos
tem muitos nomes pra ser tratado
outras que nem pensamos
só tem a palavra
mas o que ela é
ainda não foi gerado

pra provar pros passivistas acocorados
abri minha caixa de denominações
onde guardo significações ainda sem objeto
peguei um marinlinto
que veio pregado num caradobleto
falei que não são nem água de labirinto
nem sujeito obsoleto
estão esperando que chegue um dia
pra ver se tornam variações de preto
ou condensações de poesia

no meio da explicação
meu tesouro abriu caiu no chão
alguns grupos de palavras se dispersaram
foram procurar sua presa
e quando eles não acham não ficam surpresos
voltam e esperam outra oportunidade
conversam comigo à noite perto da represa
sobre conceitos de ruim chuva mato bicho e bondade

ali mesmo palavras danadas voaram
e pregaram nos cabelos da Dorinha
que era uma mulherina
formosura de mulher com verdura de menina
ela ficou rindo com meio medo
brincando e se desvencilhando de tanta céutóca
balançando a face impregnada de amoredo
correndo foi pro milharal colher pipoca

só após seu aceno e beijo mandado
pela ponta do dedo
que eu percebi com espanto
naquela graça e enredo
o verdadeiro significado
da palavra encanto

Carlos Edu

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