Côco-Verde era filho
          de Constantino Amaral
          morador no Rio Grande
          mas fora da capital
          pois sua casa distava
          meia légua de Natal

          Porém seu nome era Armando
          como o povo o conhecia
          mas a namorada dele
          essa tal de Melancia
          a ele por Côco-Verde
          chamava e ninguém sabia

          Então dessa Melancia
          Rosa era o nome dela
          porém Armando em criança
          se apaixonando por ela
          para poder namora-la
          pôs esse apelido nela

          Portanto, seu nome é Rosa
          seu pai Tiago Agostinho
          de origem portuguesa
          do pai de Armando vizinho
          seus sítios eram defronte
          divididos num caminho

          Quando Rosa fez seis anos
          e Armando a mesma idade
          os pais de ambos trouxeram
          um professor da cidade
          para instruir as crianças
          daquela localidade

          Fizeram logo uma casa
          sobre um alto, nela então
          Rosa e Armando começaram
          a receber instrução
          junto com outros meninos
          uns vizinhos outros não

          Nessa escola começou
          Armando a namorar Rosa
          pois ela além de ser rica
          era bastante formosa
          inteligente e cortez
          muito séria e carinhosa

          Rosa tinha por Armando
          uma grande simpatia
          de forma que quando o mestre
          dava nele ela sentia
          o mesmo fazia Armando
          quando ela padecia

          Ao completarem dez anos
          tanto Rosa como Armando
          em lousas um para a outro
          viviam se carteando
          mas disfarçando que estavam
          nota de carta apostando

          Depois Armando temendo
          que o mestre os descobria
          figindo que amava as frutas
          e nas notas que fazia
          tomou como namorada
          a chamada Melancia

          Rosa também pelas frutas
          fingiu amor desmedido
          e tomou o Côco-verde
          já para seu pretendido
          porém o "côco" era Armando
          ele estava prevenido

          Rosa estava prevenida
          que a melancia de Armando
          era ela, então assim
          brincavam se carteando
          diziam aos outros que estavam
          notas de cartas apostando

          Então defronte a escola
          tinha uma pedra isolada
          ficando ao lado direito
          do poente da estrada
          e dela não se avistava
          dos pais de Rosa a morada

          Armando muito sincero
          quando da escola voltava
          bem ao pé da dita pedra
          satisfeito ele a esperava
          e dali para diante
          ele a Rosa acompanhava

          Rosa ao fazer doze anos
          o mestre um dia calado
          levou todos os meninos
          pra um salão reservado
          ficando então as meninas
          no seu salão costumado

          Armando quando se viu
          no salão longe de Rosa
          não deu lição nesse dia
          por não vê sua mimosa
          o mestre então castigou-o
          com sua mão rigorosa

          Voltou Armando de tarde
          no pé da pedra esperou
          por Rosa quinze minutos
          mas ela ali não chegou
          e Armando vendo a demora
          pra casa triste marchou

          Mas Rosa no outro dia
          deixou seus pais almoçando
          e caminhou para a pedra
          onde esperou por Armando
          e quando Armando chegou
          encontrou ela chorando

          Armando lhe perguntou:
          Rosa, diz-me o motivo
          que te fez em me deixar
          tão tristonho e pensativo?
          diz-me se o nosso amor
          já morreu ou inda está vivo?

          Rosa chorando lhe disse:
          foi o nosso professor
          que não deixou-me voltar
          por causa do nosso amor
          dizendo que foi meu pai
          que a ele fez sabedor

          Disse-me mais que meu pai
          lhe disse que não convinha
          leu andar junto contigo
          pois estou quase mocinha
          portanto, só me deixasse
          vir da escola sozinha

          Armando lhe respondeu:
          pois a coisa está ruim
          como eu não posso ver
          da nossa amizade o fim
          vou ausentar-me desta terra
          pra descansares de mim

          - Amanhã em vou embora
          para nunca mais voltar
          pois minha presença aqui
          talvez te faça penar
          e mesmo não me convém
          ver-te sem poder-te amar

          Disse Rosa: tu assim
          trazes pra mim um perigo
          porque se fores embora
          eu hei de acabar comigo
          pois a vida só me serve
          se eu me casar contigo

          - Hoje não vejo quem tenha
          força capaz de fazer
          meu coração desprezar-te
          antes prefiro morrer
          pois pra tudo existe jeito
          e o jeito eu vou dizer

          - Esta pedra de hoje em diante
          será pois a nossa agência
          poderemos deixar nela
          munidos de paciência
          todo dia um para o outro
          sincera correspondência

          - Porque nosso amor precisa
          nutrir as suas raizes
          no coração um do outro
          para vivermos felizes;
          eis ai o meu destino
          vê agora o que me dizes

          Armando lhe respondeu:
          pois deixo de ir-ma embora
          porque o meu coração
          te consagro nesta hora
          e para que me acredite
          eu vou te jurar agora

          - Eu juro a Deus que jamais
          te deixarei esquecer
          um só instante em meu peito
          e juro também sofrer
          por ti qualquer desventura
          que alguém queira trazer

          - Juro mais que te pertencem
          minh'alma, meu coração
          e juro também por ti
          desconhecer a razão
          porque para defender-te
          me sujeitarei a prisão

          Rosa disse: em também juro
          por ti ser forte e ativa
          e o meu amor durar sempre
          como esta pedra nativa
          se eu não casar contigo
          juro a Deus não ficar viva

          - E se meu pai não quizer-te
          como genro, inda te digo
          daqui do pé desta pedra
          juro a Deus fugir contigo
          juro mais que meu amor
          não obedece castigo

          Nisto bateu a sineta
          da escola, convidando
          a entrada dos alunos
          pois todos iam chegando
          Rosa ai marchou com pressa
          de parelha com Armando

          Então depois desse dia
          Armando quando passava
          na pedra para a escola
          uma carta encontrava
          e Rosa encontrava outra
          à tarde quando voltava

          Quando Rosa ficou moça
          se tornou inda mais bela
          e Armando também rapaz
          consultou então com ela
          o que devia fazer
          para pedi-la ao pai dela

          Então Tiago Agostinho
          não ficou surpreendido
          pois que Rosa amava Armando
          ele já tinha sabido
          logo foi franco em dizer-lhe
          que estava feito o pedido

          Armando voltou contente
          Tiago Agostinho então
          procurou saber de Rosa
          qual a sua opinião
          se ela estava de acordo
          receber de Armando a mão

          Rosa lhe disse: meu pai
          estou de acordo, sim
          porque nasci para Armando
          e Armando nasceu para mim
          e digo logo ao senhor
          que nosso amor não tem fim

          Tiago disse consigo:
          a cousa está enrascada
          e se eu for muito ativo
          afundarei a jangada!...
          então respondeu-lhe rindo:
          breve estarás casada

          Combinou com sua esposa
          com muita sagacidade
          um jeito para acabar
          aquela grande amizade
          mas queria fazer isto
          sem demonstrar má vontade

          Mandou convidar Armando
          na tarde do mesmo dia
          e disse em vista dos dois
          que o casamento faria
          só com um ano depois
          pois era quando podia

          Logo Armando concordou
          Rosa concordou também
          Tiago disse consigo:
          este acordo me convém
          tenho tempo pra lutar
          e espero sair-me bem

          Com 2 meses depois disso
          ele falou pra comprar
          o sítio de Constantino
          para Armando se mudar
          se fazendo muito calmo
          pra ninguém desconfiar

          Então o pai de Armando
          o Constantino Amaral
          concordou vender o sítio
          depois com o capital
          buscar se estabelecer
          com uma loja em Natal

          Lhe disse Armando: meu pai
          se me tiver como amigo
          deixe de vender o sítio
          pois como homem lhe digo
          só sairei desta terra
          levando Rosa comigo

          - Depois do meu casamento
          meu pai poderá vender
          seu sítio, pois dessa vez
          não terei o que dizer
          mas agora fará isso
          se não quiser me atender

          Amaral lhe respondeu:
          meu filho estás atendido
          pois inda com sacrifício
          eu te atendia o pedido
          quanto mais que nosso sítio
          ainda não está vendido

          Tiago Agostinho vendo
          que não podia comprar
          o sítio de Constantino
          para Armando se ausentar
          procurou por outra forma
          o casamento acabar

          Chamou Armando e disse:
          Armando, o teu casamento
          não quero mais demorá-lo
          vamos dar nosso andamento
          e pra poupar-te as despesas
          um negócio te apresento

          - Eu tenho uns cortes de panos
          arrematados num leilão
          e queria que tu fosses
          vende-los lá no sertão
          com o lucro tu farás
          toda tua arrumação

          Armando logo aceitou
          o negócio esclarecido
          dizendo então que ficava
          a Tiago agradecido
          e com três dias partiu
          de fazenda bem sortido

          Tiago tinha dois filhos
          sendo casado o primeiro
          residiam em Mamanguape
          então o filho solteiro
          numa loja do irmão
          servia como caixeiro

          Assim que Armando partiu
          Tiago Agostinho então
          escreveu para seus filhos
          com a maior precaução
          dizendo que um viesse
          executar a traição

          Com quatro dias, a noite
          chegou o filho solteiro
          pronto para executar
          o plano de traiçoeiro
          Tiago antes da carta
          interrogou-o primeiro

          Pois perguntou ao filho:
          o que tu andas fazendo
          estas horas por aqui?
          parece que vens correndo?
          disse o filho: é sua nora
          que deixei quase morrendo

          - Meu irmão foi quem mandou
          eu vir lhe participar
          o estado da mulher,
          para o senhor lhe mandar
          a nossa irmã Rosinha
          pra da cunhada tratar

          - Com uma grande agonia
          ontem quase ela tem fim
          disse o doutor: ela morre
          se chegar ter outra assim;
          e meu irmão não confia
          seu trato a gente ruim

          - Então fretei uma barca
          por desmedido valor
          a qual se acha no porto
          esperando quando eu for
          e quero levar Rosinha
          veja o que diz o senhor

          Tiago lhe respondeu:
          em mando que Rosa vá
          e fico com muita pena
          de não ir com vocês, já
          porém depois de amanhã
          talvez eu chegue por lá

          - Mas mando logo uma carta
          por vocês neste momento
          onde meu filho verá
          que fico em grande tormento
          por saber que minha nora
          está nesse sofrimento

          Quando a carta estava feita
          Rosa estava preparada
          e acompanhada do mano
          partiu em marcha apressada
          pretendendo tomar a barca
          As quatro da madrugada

          Assim que os dois embarcaram
          o remador que sabia
          remou para Mamanguape
          com prazer e alegria
          aonde chegaram em paz
          na manhã do outro dia

          Quando no ponto saltaram
          Rosa com o irmão dela
          encontraram dois cavalos
          um pro mano e outro pra ela
          e um para o bagageiro
          com cangalha e não com sela

          O irmão montando Rosa
          ela disse: eu entendia
          que do porto a Mamanguape
          meia légua não seria!
          Lhe disse o irmão: é longe...
          e montou sem mais profia

          A cavalo em Mamanguape
          chegaram ligeiramente
          disse o irmão para Rosa:
          isso aqui é S. Vivente
          o bagageiro afirmou
          e logo tomou a frente

          Da cidade de Mamanguape
          Rosa nada conhecia
          e por isso acreditou
          no que o irmão lhe dizia
          e açoitando o cavalo
          caminhou com alegria

          As dez horas se serviram
          de doce com queijo e vinho
          e ao por do sol, o irmão
          à Rosa disse baixinho:
          Rosa, alviçaras, chegamos
          na casa de teu padrinho!

          Rosa bastante espantada
          lhe respondeu: é mentira
          meu padrinho aqui não mora
          e se mora me admira
          eu ter vindo a Mamanguape
          e me achar em Guarabira

          Mas logo no mesmo instante
          ouviu a voz do padrinho
          que dizia duma porta:
          viva! chegou meu sobrinho
          trazendo minha afilhada
          pra sossego de Agostinho!

          Vou deixar Rosa um instante
          e dizer primeiramente
          quem era o padrinho dela
          e porque ficou contente
          para ninguém não dizer
          que não ficou bem ciente

          Esse padrinho de Rosa
          era irmão do pai dela
          seu nome, Pedro Agostinho
          sua esposa Florisbela
          e foi um dos mais antigos
          que Guarabira viu nela

          Então Tiago Agostinho
          combinou com seu irmão
          botar Rosa em sua casa
          por meio duma traição
          e para poder fazer
          mandou Armando ao sertão

          Rosa que não conhecia
          de Guarabira o caminho
          deixou-se ir inocente
          para a casa do padrinho
          onde lhe veio a lembrança
          dum ardil mais que mesquinho

          Por isso quando ela entrou
          na casa disse ao irmão
          que lhe quisesse explicar
          daquilo tudo a razão
          pois lhe estava parecendo
          um golpe de traição

          Lhe disse o irmão: Rosinha
          vou te dizer a verdade
          é pra tu deixares aqui
          de Armando aquela amizade
          pois meu pai só deu-lhe o sim
          temendo uma falsidade

          - Para que tu não fugisse
          meu pai deu a ele o sim
          porque se assim não fizesse
          a coisa estava ruim
          pois uma amizade grande
          é bem custoso ter fim

          - Por isso ele ordenou-me
          eu te trazer inocente
          para aqui, porque aqui
          jamais encontrarás gente
          por quem tu possas mandar
          fazer a Armando ciente

          Logo Rosa respondeu-lhe:
          porém meu pai bem podia
          quando Armando me pediu
          dizer-lhe que não queria
          porque um homem de bem
          odeia a hipocrisia

          - Se eu soubesse que meu pai
          era assim tão fementido
          jamais deixaria Armando
          ter minha mão lhe pedido
          visto que aeu não era digna
          de te-lo como marido

          - Para mim comete um crime
          a filha dum traiçoeiro
          que quer se fazer esposa
          dum honrado cavalheiro
          pois a honra é luz nas trevas
          a traição não tem luzeiro!

          - Portanto, eu não deveria
          encher de amor um senhor
          filho de um pai honrado
          sendo o meu um traidor
          terei remorso por isto
          vergonha, susto e temor

          - Ma se ainda ver Armando
          juro dizer-lhe a verdade
          que não serei dele esposa
          devido esta falsidade
          mas serei dele cativa
          se ele tiver-me amizade

          Agora encerro este assunto
          porque preciso dizer
          o que foi que o pai de Rosa
          procurou logo fazer
          na hora que ela saiu
          antes do dia romper

          Assim que Rosa saiu
          o pai pegou um vestido
          dos que ela em casa deixou
          e fê-lo em sangue embebido
          dum cabrito que sangrou
          lá num recanto escondido

          Fazendo o vestido em tiras
          desceu um despenhadeiro
          até chegar num riacho
          aonde havia um banheiro
          então semeou as tiras
          ao poente do ribeiro

          E com o resto do sangue
          do cabrito que sangrou
          ele encostado ao banheiro
          a maior porção jogou
          depois perto e mais longe
          outras porções derramou

          As seis horas da manhã
          ele muito disfarçado
          fez uma grande balburdia
          gritando desesperado
          dizendo ao povo que Rosa
          um tigre havia pegado

          Logo todos os vizinhos
          acudiram com presteza
          seguindo em busca do tigre
          com desmedida afoiteza
          porque a morte de Rosa
          os sinais davam certeza

          Com bons cachorros de caça
          os homens da vizinhança
          na mata o dia passaram
          com sede de uma vingança
          e não encontrando indício
          voltaram sem esperança

          Tiago Agostinho tinha
          um negro de confiança
          no mesmo dia de tarde
          chegou-lhe à sua lembrança
          de mandar o dito negro
          enganar a vizinhança

          No outro dia de tarde
          o negro saiu dizendo:
          que tinha andado na mata
          e num lugar mais tremendo
          encontrou o corpo de Rosa
          porém num estado horrendo

          Então Tiago Agostinho
          com as mãos cobrindo a face
          em presença dos vizinhos
          disse ao negro que voltasse
          ao lugar que estava o corpo
          e lá mesmo sepultasse

          Uma sepultura falsa
          naquela mata esquisita
          e negro formou sozinho
          com precaução inaudita
          e no dia imediato
          houve ali grande visita

          Logo Tiago e a esposa
          vestiram luto fechado
          e se espalhou a sinistra
          notícia, pra todo lado
          até que Armando sabendo
          voltou bastante vexado

          Quando chegou foi à cova
          em visita fazer
          na cova deu-lhe um desmaio
          que andou perto de morrer
          passou depois oito dias
          sem quase nada comer

          Com um mês não parecia
          coitado, ser ele Aramando
          pois não comia e passava
          noites inteiras vagando
          nas estradas sem destino
          tristonhamente chorando

          E na pedra onde Rosa
          amor lhe havia jurado
          uma noite muito tarde
          ele na pedra ajoelhado
          derramou mais duma hora
          o seu pranto amargurado

          Depois de ter pranteado
          tristonho balbuciou
          dizendo: neste lugar
          foi que Rosa a mim jurou
          seu amor, uma manhã
          mas coitada, se acabou!

          - Portanto, o dever me ordena
          ir naquela mata escura
          e tirar os ossos dela
          de dentro da sepultura
          e em cima deles matar-me
          para cumprir minha jura

          Armando ai como um louco
          para a mata caminhou
          chegando na cova de Rosa
          a terra fora jogou
          e ficou mais que surpreso
          já quando nada encontrou

          Sem chorar refez a cova
          consigo mesmo a dizer:
          aqui existe um mistério
          e se Deus me favorecer
          haverei de desvendá-lo
          pois é este o meu dever

          noutro dia disse ao pai:
          meu pai me faça um pedido
          de vender seu sítio agora
          pois eu estou resolvido
          ir morar no Piaui
          visto Rosa ter morrido

          Amaral foi a Tiago
          vendeu o sítio e saiu
          e Armando de Tiago
          tristonho se despediu
          figindo chorar por Rosa
          Tiago oculto sorriu

          Armando no Piaui
          disse ao pai: meu pai, agora
          vou dizer-lhe um segredo
          que o senhor ignora
          olhe, Rosa não morreu
          o certo qu'ela está fora

          - O pai em minha ausência
          preparou uma cilada
          pois cavei a cova dela
          dentro nõ encontrei nada
          Amaral sabendo disso
          teve uma raiva danada

          Porém Armando lhe disse:
          meu pai, não tenha vexame
          pois Rosa aonde estiver
          talvez ainda me ame
          portanto, o senhor escreva
          uma carta àquele infame

          - Essa carta irá tarjada
          lhe dizendo que morri
          com um mês e oito dias
          que cheguei no Piauí
          e ele acreditará
          sem mandar ninguém aqui

          Como de fato, Amaral
          para Tiago escreveu
          uma carta onde mostrava
          ser sincero amigo seu
          narrando a morte de Armando
          como melhor entendeu

          Oito meses já faziam
          que Rosa tinha saido
          e que Aramando se mudara
          ela não tinha sabido
          como também da cilada
          da onça haver lhe comido

          Coitada, da terra dela
          ela não via um vivente
          empora que seu padrinho
          já estava bem ciente
          de tudo que se passou
          só ela estava inocente

          Rosa então se comparava
          a uma prisioneira
          procurava ninguém vê-la
          e chorava a vida inteira
          numa sombra projetada
          por uma guabirabeira

          Chorando dia ela:
          oh! meu Deus, oh! pai clemente
          trazei conforto e consolo
          a uma pobre inocente
          que sem fazer mal a ninguém
          vive a sofrer cruelmente!

          - Consenti Senhor, que 1 anjo
          produza um sonho a Armando
          que me veja assim tão triste
          constantemente chorando
          pra ele ficar sabendo
          que vivo nele pensando

          Tiago tendo a certeza
          que Armando tinha morrido
          sorrindo disse à mulher:
          fui muito bem sucedido
          pois ganhei numa empresa
          que me julgava perdido

          Foi a todos os vizinhos
          lhe dizendo a falsidade
          que tinha feito com Rosa
          devido aquela amizade
          pois sabia que Aramando
          morria na flor da idade

          Logo mandou buscar Rosa
          que com seis dias chegou
          então foi quando ela soube
          de tudo que se passou
          depois da morte de Armando
          a carta o pai lhe entregou

          Rosa quando viu a carta
          pôs-se a chorar sua sorte
          ela quando leu a carta
          deu-lhe um desmaio tão forte
          que passou quase uma hora
          sob o domínio da morte

          Mas depois que melhorou
          disse ao pai bastante irada:
          meu pai, a morte de Armando
          fez-me uma desgraçada
          porém juro que não tarda
          eu também ser sepultada

          - O Senhor foi o culpado
          desta desgraça fatal
          com mentiras criminosas
          fez Constantino Amaral
          vender seu sítio e sair
          fazendo a Armando esse mal!

          - Mas juro, enquanto for viva
          viver coberta de luto
          pois a lembrança de Armando
          tem no meu peito um reduto
          juro não partir com outro
          meu amor absoluto!

          Rosa depois desse dia
          tomada pelo desgosto
          uma mortal palidez
          apareceu no seu rosto
          e de Santa Madalena
          fez-se o modelo composto

          Vendo os seus pais o desgosto
          começaram a ter receios
          então para distraí-la
          empregavam muitos meios
          até mesmo ordenando
          que ela fizesse passeios

          Mas Rosa não pesseava
          se comprazia em chorar
          vivendo sempre num quarto
          sem querer se alimentar
          a bem da alma de Armando
          levava a vida a rezar

          Armando no Piauí
          sonhou chegar-lhe um rapaz
          que tinha a vestes douradas
          cabelos louros pra traz
          e para fitar-lhe o rosto
          ninguém seria capaz

          Armando lhe perguntava:
          quem és tu? Donde vieste?
          o rapaz lhe disse: eu sou
          um mensageiro celeste
          mas venho daquela pedra
          onde uma jura fizeste

          - Como eu fui testemunha
          daquela grande amizade
          que juraste a uma jovem
          como doze anos de idade
          venho então da parte dela
          te dizer uma verdade

          - Essa moça por ti vive
          constantemente a chorar
          e és tu que deverás
          o pranto dela exugar
          se não um dia o seu pranto
          virá também te molhar

          Armando nisso acordou
          aflito e muito suado
          parecendo ainda ouvir
          uma voz dizendo ao lado
          é necessário que cumpras
          o que por ti foi jurado!

          Armando disse chorando:
          que coisa misteriosa!
          pois bem, embora eu caia
          numa falta criminosa
          farei Tiago dizer
          onde foi que botou Rosa

          E sem demora embarcou
          pro Rio Grande do Norte
          destinado a encontrar Rosa
          e toma-la por consorte
          disposto a morrer lutando
          a favor de sua sorte

          Trouxe consigo um caboclo
          homem sério e destemindo
          então contou-lhe na viagem
          o que tinha acontecido
          e o amor dele por Rosa
          de quando havia nascido

          Tiago buscou fazer
          na noite de S. João
          um briquedo em sua casa
          com grande reunião
          para ver se Rosa achava
          naquilo uma distração

          Saltou Armando em Natal
          nessa noite de S. João
          e sobre a vida de Rosa
          teve exata informação
          então projetou fazer
          a Tiago uma traição

          Às onze horas da noite
          quando Tiago Agostinho
          servia seus convidados
          algumas taças de vinho
          viram dois vultos passar
          ao poente do caminho

          Não precisa que eu diga
          que um vulto era Armando
          e o outro era o caboclo
          que vinha lhe acompanhando
          e para se disfarçarem
          caminhavam conversando

          Armando logo avistou
          sua amante idolatrada
          muito magra e diferente
          sem companheira, sentada
          num banco em frente a fogueira
          de luto desconsolada

          Vendo Armando o seu estado
          tão tristonha a meditar
          sentiu tanta comoção
          que começou a chorar
          quis parar, mas o caboclo
          mandou ele caminhar

          Armando exugou os olhos
          lhe veio então a lembrança
          ir na pedra onde Rosa
          ainda muito em criança
          jurou de fugir com ele
          com uma voz firme e mansa

          Chegando Armando na pedra
          depois de bem refletir
          ensinou ao caboclo
          como ele podia ir
          levar um recado a Rosa
          sem ninguém lá pressentir

          O caboclo disse a ele:
          pode ficar descansado
          que eu já estudei um plano
          para lhe dar o recado
          e tenho toda certeza
          que vai dar bom resultado

          E sem demora seguiu
          e logo chegou contente
          no terreiro de Tiago
          chamando o povo parente
          se aproximou de Rosa
          e lhe pediu aguardente

          Quando bebeu aguardente
          se aproximou da fogueira
          dizendo então que cantava
          cantigas de capoeira
          o povo então fez com ele
          animada brincadeira

          Por fim o povo pediu
          para o caboclo cantar
          o caboclo bebeu mais
          e depois de se sentar
          com esta estrofe seguinte
          entendeu de começar

          - Eu venho de muito longe
          do pé duma grande serra
          acompanhado de alguém
          mas não venho fazer guerra
          vim dizer a Melancia
          Côco-Verde está na terra

          Rosa ouvindo essa conversa
          teve um susto de tremer
          e conheceu que o caboclo
          procurava lhe dizer
          um segredo que só ela
          era capaz de saber

          O caboclo conhecendo
          que Rosa tinha ficado
          como que sobre-saltada
          olhando para o seu lado
          resolveu a se calar
          para ver o resultado

          Mas logo Rosa lhe disse:
          seu peito não é ruim
          portanto cante de novo
          faça esse pedido a mim
          o caboclo fitou ela
          e seguiu dizendo assim:

          - Eu não tenho o que cantar
          e outra que estou vexado
          pois cheguei agora mesmo
          inda não estou descansado
          só vim dar de Côco-Verde
          a Melancia um recado

          - Se não fosse grande amigo
          de alguém que ficou chorando
          não me atrevia trazer
          o recado que estou dando
          Melancia, Côco-Verde
          está na pedra esperando

          Rosa fitando o caboclo
          levantou-se sem demora
          dizendo que ia dormir
          o quarto fechou por fora
          e para o lado da pedra
          caminhou na mesma hora

          Chegando perto da pedra
          avistou um vulto junto
          disse Rosa ao vulto:
          responde o que te pergunto
          se és anjo ou fantasma
          se és vivo ou defunto?

          O vulto lhe respondeu:
          não tenha medo, querida
          que sou Armando Amaral
          a quem julgavas sem vida
          venho plantar em teu peito
          uma esperança perdida

          Gritou Rosa: meu Armando
          me escuta por caridade
          eu te tinha como morto
          meu Deus, que felicidade!
          Jesus teve dó de mim
          e descobriu-me a verdade

          Logo Armando abraçou-a
          louco de amor e chorando
          Rosa sem poder falar
          deu-lhe um beijo soluçando
          quando viram o caboclo
          vinha apressado chegando

          Dando o braço Armando a Rosa
          lhe disse: vamos querida
          confia no meu critério
          pois tu és a minha vida
          Rosa só fez responder-lhe:
          por Deus fui favorecida

          Na mesma noite em Natal
          saltaram em uma casa
          sob a proteção dum vento
          soprando de popa à proa
          até chegarem em Macau
          fizeram viagem boa

          Saltando Armando em Macau
          deu ligeiro andamento
          a se esposar com Rosa
          cumprindo seu juramento
          e o padre da freguezia
          celebrou o casamento

          E escreveu a Tiago
          uma carta que dizia:
          "senhor Tiago Agostinho
          me desculpe a ousadia
          de eu carregar sua filha
          para minha companhia"

          "Eu sou Armando Amaral
          a quem o senhor julgava
          estar morto para sempre
          como a carta lhe afirmava
          aquilo foi para eu ver
          se Rosa ressuscitava

          Abrindo a cova da mata
          descobri sua traição
          porém gurdei o segredo
          até nesta ocasião
          porque já tenho a certeza
          que não perdi a questão"

          Vinte dias já faziam
          que Rosa tinha saido
          então ninguém não sabia
          pra onde ela tinha ido
          pelo qual já se julgava
          que ela tinha morrido

          Em busca dela Tiago
          andava constantemente
          mas para dar-lhe notícia
          não encontrava um vivente
          quando recebeu a carta
          ficou de tudo ciente

          Tiago muito zangado
          pensando disse consigo:
          é muito exato o adágio
          usado no tempo antigo
          "o amor quando é sincero
          zomba do seu inimigo"

          Então a felicidade
          veio em socorro de Armando
          enricou sem proteção
          só com Rosa lhe ajudando
          e Tiago arrependido
          lhe pediu perdão chorando

          Viveu Armando com Rosa
          na mais perfeita harmonia
          brincando Armando chamava
          a ela de Melancia
          e ela a ele Côco-Verde
          mais a amizade crescia

          Já demonstrei nesta história
          O amor o quanto é
          Só o amante sem fé
          Esmorece sem vitória

          Conservem pois na memória
          A opinião de Armando
          Mostrou seu amor lutando
          E conseguiu triunfar
          Luto só fez assombrar
          O namorado nefando

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