Auto-Retrato Falado

Venho de um Cuiabá garimpo e de ruelas entortadas.
Meu pai teve uma venda de bananas no Beco
              Marinha, onde nasci.
Me criei no Pantanal de Corumbá, entre bichos do chão,
              pessoas humildes, aves, árvores e rios.
Aprecio viver em lugares decadentes por gosto de estar
              entre pedras e lagartos.
Fazer o desprezível ser prezado é coisa que me apraz.
Já publiquei 10 livros de poesia; ao publicá-los me
              sinto como que desonrado e fujo para o
              Pantanal onde sou abençoado a garças.
Me procurei a vida inteira e não
me achei - pelo
              que fui salvo.
Descobri que todos os caminhos levam à ignorância.
Não fui para a sarjeta porque herdei uma fazenda de
              gado. Os bois me recriam.
Agora eu sou tão ocaso!
Estou na categoria de sofrer no moral, porque só
              faço coisas inúteis.

                                                            Manoel de Barros

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