Sob medida

Todos os dias, os meus sapatos
me acordam com lambidas nos lábios
buscam meu pão e me levam ao trabalho.
Eles já tentaram morder os vizinhos e companheiros
por isso eu os calço
devidamente enfucinhados e enforcados na coleira.
Suas solas gastas, quase esquecidas
através delas o asfalto não é uma lembrança
e não me esqueço de estar acordado.
Eles já mastigaram todos os meus cintos
começo a caminhar segurando as calças.
Será que hoje, mais uma vez, eles vão se mijar
e vão me colocar entre suas pernas
como se eu fosse um rabo diante do chefe?
A vizinhança também reclama
a respeito do monte de merda que os calçados
consigo arrastam e depositam
diariamente em suas calçadas
e todos os dias levo um saco cheio
e uma pá-de-jardim atravessada na garganta.
Ainda por cima, não me são totalmente fiéis
cobram por seus serviços roendo os ossos dos meus pés.
No entanto, sabem muito bem que dependem de mim
se os largasse em uma praça qualquer
ninguém os levaria a um passeio
a sarna de seu retovo mete medo.
. . . Todos os dias, chegamos em casa cansados
e como não tenho ninguém que os tire
dormimos juntos, e só não repartimos o mesmo travesseiro.

                                                                         Dimitrios Valentim

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