FADAS DE LUTO

Escondeu-se numa gravata preta
e ali ficou doendo a própria noite.
Fadas de luto ele enxergava longe
tecendo cerradíssimas neblinas.

A gravata apertava-lhe o pescoço
mas era uma cortina imprescindível
porquento era o arrimo do seu corpo
envolvido por um colar de lágrimas.

Deixava-se ficar inaderente
mesmo aos menores sopros da existência.
Mal suportava o peso do seu corpo.

Certo dia foi visto numa esquina
de um arrabalde fosco e revogado.
O seu corpo pendia da gravata.

                       Olney Borges Pinto de Souza


Do livro: Último convívio, João Scortecci Editora, 1995, SP

O retrato velho

Perfumo este retrato velho envelhecido
embora a poeira dificulte os traços,
retraia os tons e inibições ajunte
sobre as tímidas névoas do sombreado.

Químicas atuações dos sais tempo
desnivelaram a fotografia
de modo que a figura sobressai
os sulcos em que foi perdendo espaço.

O retrato, contudo, está perene
pelos sinais intrísecos que guarda
sigiloso entre w sob os grãos de poeira.

Perfumo, pois, este retrato velho
e a incidência do aroma como um beijo
resgata a plenitude da figura.

                  Olney Borges Pinto de Souza

Voltar