CHEIA DE NADA

Nada mais é meu.
nem as horas tenebrosas do acordar.
Nada mais.
nem afeto, desfeito,
neste instante-desfeito.
Nada mais.
nem a sequidão dos sonhos! – quem dirá eles! –
Sim.
Nada tenho de meu.
Ah! E ‘como' precisava ter!

Nada, nada mais tenho.
nem um sabor tóxico qualquer.
nada.
nem uma vontade desejosa sequer.
nem desespero tenho de meu
nem por empréstimo o tenho.
Nada.

Um nada está a me perseguir
e mesmo esse nada
está decidido a desistir
para que nem isso eu tenha.

Nada mais é meu.
nem o terror das horas inúteis
nem o temor das horas vazias
Graça não há que me seja mais.

Desisto antes, do nada,
antes que ele, de mim desista.
mas até pra isso já é tarde.
nem esse abismado poder tenho mais.
Sim.
Estou cheia de nada, de nadas.
Absolutamente vazia por isto.

Nada mais é meu.
nem tudo o que não sinto é meu.
Ah! essa falta de poder.
Ah! este vazio poderoso que me toma
e domina tudo de mim.

Nem uma palavra, nem uma
sentença,
nem de vida, nem de morte.

nem um cheiro, acre ou doce,
sob o travesseiro
ficou de meu.
nem um sonho obsoleto ficou,
Nenhuma alegria emersa
nem tristeza imersa ou submersa
nada. nem isso.

Nada, nada mais tenho de meu.
nem os olhos do imaginar
Minha angústia é praça de
taba exterminada.

Cegos e loucos são os dias que me cercam.
E não me pertencem, por certo.
Nem as noites há como ver.
Escuridão intensa reluzente.
Só essa luz incômoda,
mostrando que nada mais é meu.
nem essa lágrima densa de cristal, petrificada
que teima em escorrer;
nem um pedaço dessa gota é meu.
Eis a dor de nada ter.
nem de ter como deter essa dor. Nem isso.

Não há mais nada de meu.

                                                 Yonne Santiago
01/03/01

3º lugar no Concurso de Poesia do Mapa Cultural Paulista - 2005/2006, SP

« Voltar