O PRIMEIRO DIA DO ANO
Uma folha amarela. E era um novo dia
que surgia relutante nas montanhas.
A mim mesmo reclamei a graça imerecida
de poder continuar andando pelo bosque
e insisti em lavar com a água mais pura
a ferida da vida aberta como uma porta.
Rodeado por uma nuvem caída, tornei a ouvir
a intimidação da noite, oculta entre as árvores.
Era o uivo de um bicho que sempre me espreitou.
E aquele dia era insensato como qualquer outro,
dividido entre o vento e as folhas amarelas.Lêdo Ivo
Do livro: Poesia completa - 1940 - 2004, estudo introdutório de Ivan Junqueira, Ed. Topbook, RJ, 2004