Trick or treat
(Uma bala ou uma brincadeira)

Hoje vi vampiros, bruxas, lobisomens,
fadas, rainhas e príncipes.
Vi Batmam, Mulher Aranha,
Mickey Mouse, Rabbit (o coelho esperto).

Ontem compramos balas e doces
para enfatizarmos mais ainda suas fantasias,
complementando os sonhos
das crianças no mundo de Walt Disney.
Adoçando mais, aquelas carinhas pintadas
boquinhas de carmim: campos de feno que adornam cálidos rostos
com incrustadas pedras de águas-marinhas
e sorrisos de alvas pérolas.

Hoje foi noite de Halloween.
E as crianças se entrelaçaram
com sorrisos, gestos e palavras;
Roda a roda gigante do futuro.

É noite de Halloween
E as crianças chegam
pelos indicadores nas casas:
lanternas de pumpkin,
uma fantasmagoria esculpida em caras.
E elas sabem que compramos ontem
O que oferecer-lhes.
Hoje guardamo-nos na expectativa
da entrega das balas e dos doces.

Foi noite de Halloween.
Os cinemas nos mostraram
filmes de assombração.
A televisão exibiu a pele negra
que cobre os esqueletos,
com seus sistemas ainda vivos,
das crianças da Somália tombadas sem força,
com a certeza somente do ar que ainda respiram.

E revivi o nazismo,
os campos de concentração e
  Cândido Portinari, o grito, o apelo, em
"Os meninos de Brodósqui".

Da pele negra,
rostos de finos traços,
sobram-lhes olhos
que seriam de brilhantes topázios,
mas que definham num breu opaco.

Foi na noite de Halloween
que eu vi também as crianças da Somália.

                                       Marlene Andrade Martins

Do livro “Sonhos de Vitrines", Ed. O Lutador, 1993, Belo Horizonte/MG