"POETICIDADES E OUTRAS FALAS"
RUBENS DA CUNHA


Reside em Joinville, SC. Autor de "Campo Avesso" e "Visitações do Humano". Acadêmico de Letras. Escreve semanalmenteno Jornal A Notícia e coordena o Grupo de Poetas Zaragata. Na Web tem o e-book: "A busca entre o vazio", disponível para download, na URL: <http://www.arcosonline.com/index.php?option=content&task=view&id=146&Itemid=>. Blog "Casa de Paragens": <www.casadeparagens.blogspot.com>.

Coluna de 23/1
(próxima coluna:9/2)

Quatro poetas românticos relatam suas experiências

O vento nesta manhã não veio. Velho, conduzo meus espaços de sonhos, meus esboços de antemão para depois da morte. Sou um homem idoso, que brincou de poeta quando jovem. Os versos vinham, aéreos, escorregavam pelas mãos para o branco dos papéis. Depois, meu tempo foi se esgotando, nunca mais me aconteceu adivinhar o poema na nuvem, na árvore, no rio, no vento da manhã. Sobrou um pouco de técnica, palavra após palavra, tijolo sobre tijolo. Menti-me poeta assim durante o resto do tempo. Agora até isso secou. Ossos falhos, músculos mortos, pele adensada em rugas. Nenhum poema.

Acho que sou poeta. Tenho catorze anos e amo tanto. A forma de encaminhar tudo que sinto é o poema. Só ele consegue ser curvo, misterioso, forte como o meu amor. Só ele dá vazão a este poço sempre cheio que carrego dentro do peito. Poesia é sentimento. Podem todos dizer que não, que exige transpiração, inteligência, pensamento. Nada disso pra mim vale, tenho catorze anos. Poesia é somente emoção: direcionada, abrupta, sincera. Um dia, quando for velho talvez a técnica venha me dizer o que tenho que fazer. Agora, sou apenas um garoto que é poeta. Isso é infinito e pra mim basta.

O primeiro livro. Que alegria. Que imunidade me dá o fato de ser poeta com livro publicado. E perder o controle. E ter meus versos vagando por aí, de olho em olho, até chegar no cerne de alguém, roubar-lhe um pouco a respiração. Sempre falei de amor. Não desisto nunca. Podem dizer que meus versos são clichês, ruins, pouco originais. Não importa, o que sei é que estão concentrados nos livros e fazendo a vida de alguns um pouco melhor, mais delicada. Eu sempre sofri por causa do meu excesso de sentimento. Mas sobrevivi porque Deus me deu a capacidade de transformar minha dor em poema. Mais um autógrafo: sim, como você se chama?

Sou poetisa. Não gosto destas modernidades de poeta. Poeta é homem, poetisa é mulher. Pronto. Tão mais bonito: Poetisa. Faço versos de amor, claro, que mulher não pode falar de outra coisa. Somos só amor, por que vamos falar de outra coisa. Ficam por aí adulando umas senhoras que se dizem modernas e ficam falando de política, Deus, cidades, sexo, nos seus versos. Comigo não. Sou poetisa que celebra a vida, a virtude e o amor sincero. Todos gostam dos meus poemas, menos meu filho. Disse que eu sou pueril, tenho que escrachar mais. Eu nem sei o que é escrachar. Só sei o que é o amor, por isso sou poetisa.

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