Solange Firmino

Professora do Ensino Fundamental e de Língua Portuguesa e Literatura do Ensino Médio. Escritora, pesquisadora. Estudou Cultura Greco-romana na UERJ com Junito Brandão, um dos maiores especialistas do país em cultura clássica.

Mito em contexto - Coluna 09
(Próxima: 20/9)

Torres vulneráveis

Atualmente podemos viajar para vários cantos do mundo e visitar igrejas lindas com suas torres apontando para o céu, como a Sagrada Família, em Barcelona. Podemos fotografar monumentos como a Torre Eiffel, em Paris; o Cristo Redentor, no Rio de Janeiro; a Estátua da Liberdade, em Nova Iorque; o Big Ben, em Londres, e a Torre inclinada de Pisa, na Itália. Mas nem se essa torre inclinada cair (sozinha), e já provaram que é difícil, conseguirá ser tão marcante quanto a queda dos dois edifícios chamados World Trade Center ou Twin Towers , as Torres Gêmeas de Nova Iorque.

Tão marcante foi o fato que a data da queda das Torres Gêmeas virou substantivo, o “Onze de setembro”. Fato e data são lembrados todos os anos com a perplexidade e a dúvida sobre o que simbolizavam aquelas torres para nós, do século XXI, e quais os idealizadores e os reais motivos de sua destruição.

Além dos monumentos citados, não podemos, entre os que resistem, visitar a famosa Torre de Babel, mencionada no livro de Gênesis, da Bíblia, construída com o intuito de alcançar o Paraíso. O castigo mandado por Deus foi a confusão entre as línguas dos seus construtores. Se houve a pretensão de unir a todos em uma mesma língua ou mesma ideologia, o que tentamos fazer hoje com a globalização, veio a resposta que isso não é possível. Mas ainda construímos torres.

Em um conto infantil, a bruxa prendeu Rapunzel em uma torre, mas o príncipe subiu pelas suas longas tranças. Na mitologia grega, o rei Acrísio prendeu a filha Dânae em uma torre, mas não por muito tempo.

Uma das mais famosas histórias da mitologia diz assim: o rei Acrísio soube pelo oráculo que teria um neto que o mataria. Para fugir do seu destino, o rei trancou a filha Dânae em um torre de bronze. Dânae ficou na torre até receber a visita de Zeus, metamorfoseado em chuva de ouro. Dessa união nasceu o herói Perseu.

Acrísio mandou fazer uma arca e lançou Dânae e o filho ao mar. Os dois foram encontrados em uma praia pelo pescador Dictis. Polidectes, o tirano irmão do pescador, apaixonou-se por Dânae. Um dia, querendo afastar Perseu da mãe, obrigou-o a trazer-lhe a cabeça da Medusa, uma das três Górgonas, criaturas monstruosas com cabelos de serpentes. Não era fácil matar a Medusa , pois bastava um olhar para que transformasse alguém em pedra.

Perseu teve um longo caminho de aventuras até conseguir a proeza. Com os conselhos de Hades, Atena e Hermes, Perseu conseguiu armas e um jeito de falar com as Gréias, três irmãs da Medusa, que dividiam um olho entre si. As Gréias indicaram a Perseu como conseguir a capa da invisibilidade, botas aladas e sacola especial para colocar a cabeça da Medusa. Perseu guiou-se pela imagem da Medusa refletida no espelho de Atena e a decapitou.

Sobrevoando de volta, Perseu encontrou Andrômeda acorrentada em um rochedo. A mãe de Andrômeda, Cassiopéia, provocou a ira de Posseidon ao dizer que era mais bonita que as ninfas marinhas. O castigo enviado foi a inundação e a presença de um monstro marinho. Um oráculo disse que a única maneira de salvar o reino seria oferecer Andrômeda em sacrifício. Com a cabeça da Medusa, Perseu petrificou o monstro.

Após casar com Andrômeda, Perseu voltou para Argos querendo recuperar a amizade do avô. Em um jogo, Perseu atirou um disco, que desviou e atingiu Acrísio na arquibancada, cumprindo tragicamente a profecia da qual tentou escapar.

No mito de Eros e Pisqué também há uma torre. Psiqué era amada pelo deus Eros, mas não podia vê-lo. Sob influência das irmãs, Psiqué viu Eros enquanto ele dormia. Magoado, Eros foi embora, deixando Psiqué desesperada a ponto de enfrentar a mãe de Eros, a deusa Afrodite, que lhe deu quatro provas humanamente impossíveis.

Uma das tarefas era ir ao Hades pedir a Perséfone um pouco de sua beleza em uma caixa. Perdida e quase desistindo, Psiqué subiu em uma torre para se atirar, mas esta lhe indicou a melhor forma de cumprir sua tarefa no reino dos mortos.

Os prédios são as versões modernas das antigas torres, que sempre estiveram presentes na arquitetura da humanidade, assim como muros, fortalezas e castelos, que tinham o objetivo de proteger, vigiar e até de subjugar. A Torre de Babel caiu, as muralhas de Tróia caíram, o Muro de Berlim caiu, as Torres Gêmeas caíram.

Mesmo como símbolo de grandeza e verticalidade, real ou mítica, a torre ainda demonstra o quanto somos vulneráveis, como o episódio do “Onze de setembro” nos faz lembrar. Cada símbolo vem de um tempo diferente na história e no imaginário, mas alguns nos dizem que não alcançaremos os céus com elementos materiais, embora nos digam que o caminho é para o alto.

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