"DIVERSOS CAMINHOS EM BLOCOS", POR ZANOTO |

Jornalista famoso do Correio do Sul (Varginha/MG), desde 1950 mantém a coluna lítero-poética "Diversos Caminhos" naquele jornal.
Manteve coluna em Blocos Online de janeiro de 1998 a dezembro de 1999, e agora retorna à Internet, novamente através de nosso site.
C. Postal, 107 - 37002-970 Varginha/MG

Coluna de 15/1
(próxima: 15/02)

1. É uma beleza, me diz Rodolfo Serkin, não sermos críticos de romances, ensaios, contos, podendo ficar tranqüilamente na nossa posição de leitores e apreciadores de todos esses gêneros literários. Uma posição, aliás, de leitores anônimos. O certo é que a gente vai deixando fazer bem à nossa sensibilidade. Não há, pois, compromissos.

2. Um trago? Um trago num cálice de vinho? Que gosto tem? É dificílimo dizer onde está o fundamento. Rezei antes de jantar, minha intenção era boa. Não quero desviar, agora, o curso do caminho, a trajetória da vida.

"Pão-de-queijo leve.
Com café. Gostoso é
Na manhã tão breve."
          (Francisco de Assis Nascimento)

3. Pois é... disse Bruna Lombardi: "eu gosto dos venenos mais lentos/ dos cafés mais amargos/ das bebidas mais fortes/ e tenho/ apetites vorazes"... Quantas idéias, meu caro, a gente precisa ter, para sair por aí, pelo mundo. Quantas opiniões são preciso ser registradas? Gilda me disse que detesta bebidas fortes. Pediu-me, outro dia, que trouxesse para ela balas de erva-doce. Enfim, irei focalizar, qualquer dia, um tema dramático. Hoje descobri que o vento tem pescoço e dedos compridos. É por isso que gosta de mexer nas coisas.

4. Então, Artur da Távola afirmou: "o clarinete sugere, jamais impõe"... Nem todos estão imóveis. O papiro descreve o espaço vazio. Meus olhos enxergam o oco da súplica, o oco da solidão. E me ponho a pensar. "Paixão. Só dela cresce/ o fôlego de um rumo" (Lupe Cotrim Garaude). De que forma, pois, devo contar esta história? A cor das ruas é a cor do solado dos sapatos.

5. NOITE ILUMINADA

A noite,
com medo de si mesma,
aplaude os relâmpagos
que a iluminam!
           (Silvério da Costa/ Chapecó - SC)

6. "Oom além de poeta, era também um lagarto", disse Eno Teodoro Wanke, na fábula "O lagarto e as estrelas". Evidentemente, se tratava de um poeta "à moda dos lagartos". Olhava, à noite, as estrelas com olhos gulosos, como os poetas-homens. Todos, sem excessão, têm vontade, inclusive os lagartos, de devorar as estrelas, especialmente quanto mais brilhantes elas forem. Oom, por exemplo, tinha ganas de amorosas e sensíveis sobre as estrelas e se amolecia sob elas. "Elas estavam muito altas — concluiu Oom, num lampejo de inteligência". Oom, imaginando estar devorando estrelas com sua língua comprida, ao cintilar das estrelas, engoliu centena de pirilampos.

7. COMBATE
Hugo Pontes (Poços de Caldas)

No terceiro round:

entre um guisado e um assado,
o peso pesado
nocauteou
o assalariado.

8. RIMBAUD ENCONTRA AUGUSTO DOS ANJOS
"A noite cessa de ser noite./ Murchou o universo?? De agora em diante / não farei mais versos" (Fabrício Marques). — Será que o poeta de fato é um ser à parte?

"tá ficando difícil", disse o poeta Sérgio Fantini. Qual foi, em seguida, a conclusão do poeta? — minha última esperança / é o suicídio coletivo"...

9. Obrigado, Aymar (Aymar de Mendonça Lopes) por ter escrito, com inteira e sensível inspiração, "ÚLTIMO SONHO". "(...) Borboletas errantes/ trocam beijos de vento/ saudando o farfalhar do rosmaninho/ à beira do riacho azul"... Escuto, não sei se trazido pelo vento, Iacyr Anderson de Freitas: "... duas borboletas grifam a paisagem"...

10. O furor da fome entupiu o pote de barro.
      As cadeiras e mesas ficaram espalhadas pelo pátio, depois da briga.
      Afinal, o que vamos fazer, hoje, de nossos sonhos e filosofias?

11. DISTÂNCIAS - Olho no olho, no frio,/ deixa-nos também começar assim: / juntos/ deixa-nos respirar o véu/ que nos esconde um do outro,/ quando a noite se dispõe a medir/ o que ainda falta chegar/ de cada forma que ela toma/ para cada forma/ que ela a nós dois emprestou. (Paul Celan).
      Pelo amor de Deus, não me mande a galinha gordurosa para a mesa, quero-a sequinha, tá!

12. Escrevo porque me apetece, e pronto. Porque a tarde está quente e azul. Escrevo porque Paulo Leminski me incentivou. Disse ele: "Escrevo porque amanhece,/ e as estrelas lá no céu/ lembram letras no papel,/ quando o poema me anoitece."... Enfim, escrevo porque gosto. Escrevo porque esta tarde de hoje me obrigou a encontrá-la.

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