PELO BURACO DA FECHADURA

Digo sempre a uma amiga que esse negócio de chat, da Internet, muito parece com o buraco da fechadura. Acho que foi a Clarice Lispector que disse que o proibido sempre atrai. Atraído pela curiosidade de saber o que acontece naquele espaço, de polegadas, da sala ou chat. Ou mesmo de procurar a sensação única de abater uma caça; seja homem ou mulher. E você fica olhando quem tecla e entra na sala. Você enxerga códigos e desenhos e, não vê as pessoas. Essa idéia lembra algo de mascarados no salão, de confissão de solitários, alguma coisa de falta do que fazer ou de sono. Seria o chat um novo modo de ver?
No espaço virtual da sala, você se torna um personagem ilhado com suas fantasias.
Hoje, a tentação é de tanto atrativo visual, que a gente fica distraído, dispersivo e com preguiça de pensar. Pensar dói e incomoda... É o medo de cair no campo do vazio e do choque existencial.
Uma criança olha no buraco da fechadura a mulher que troca a roupa: descobre a diferença e a atração física. Sua câmera fotográfica tem as lentes limpas aos detalhes do mundo. Ela toca na madeira da porta onde liga a árvore, logo, lembra a fogueira de São João, a vida da natureza. Havia um tempo para descobrir cada coisa... Essa tal chama dos navegadores pela aventura no mar da existência!
E se você experimentar não atentar o que vê na cidade exterior todos os dias? O hábito suja os olhos, aquele nosso campo visual de nossa rotina. Mas há o que sempre descobrir: ver, olhar, conversar: gente, aroma, lugares, bichos.
Nossa lente, muito opaca, desgastada pela mecanização, olha as coisas simples da vida com indiferença.

Rubens Shirassu Jr.

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