De unhas aparadas

Quando, em Paris, mostrei ao cirurgião cardiovascular Leonardo Esteves Lima meus exames, ele foi taxativo: “ Você pode morrer, a qualquer instante. Nem demora. Não dá tempo nem para sentir dor.”
Apesar de tão drástico anúncio, fui remanchando e só oito, nove meses, depois me submeti à curiosidade do bisturi de seu chefe. Que antes de me amputar a aorta, falou dos graves riscos da intervenção cirúrgica  que me era reservada.
Pois bem. Não tomei maiores providências no que diz respeito a dinheiro, — talvez porque nem adiantasse —, não tinha o que fazer  para cuidar do dia seguinte da família. À véspera de me hospitalizar no Pitié - Salpêtrière, fui, porém, à manicure. Se tivesse de me apresentar ao Senhor que me encontrasse, pelo menos, de unhas cuidadas.
Quando na barbearia conto tal fato ao Pádua Barroso, o grande advogado lembra a mãe que, à véspera de qualquer crise cardíaca mais grave, convocava cabeleireira e manicure, alegando não desejar ser defunta mal tratada, desleixada. Precisava fazer cabelos e unhas, para assim comparecer junto a Deus-padre...

Lustosa da Costa