Toaletes do além

Fato verídico, ocorrido nos arredores de Sidney, Austrália, e noticiado nas rádios da Oceania.

Um homem mandou fazer um par de botas sob medida. Não que tivesse calos, olhos de peixe, neuromas ou joanetes, não. Tinha pés perfeitos, adequados à sua estatura. Apenas queria botas que imitassem pés-de-cabra. O sapateiro, um velho italiano, amante de vinho, música e democracia, não discutia encomendas, mesmo infernais como essa. Internamente, daria ao calçado o conforto natural que sempre oferecera. Externamente, a aparência caprina. Não perguntou se era pro carnaval, peça de teatro, cerimônia macabra, fantasia sexual, isso era problema do freguês. Cobrou bem e divertiu-se, prego! O cliente era um cara espigado com olheiras bossa Zorro.Numa noite de lua cheia, calçou seu modelito diablo e saiu pela noite.

Enquanto isso...

Um outro homem, chamado Tomé, saiu da sua igreja muito cabreiro; o pastor suplicara extasiado: “O dízimo, o dízimo, o dízimo!”  E sapecara um sermão em tom lúgubre; que os fiéis se lembrassem: o fogo do inferno queima a vítima eternamente! Tomé andava questionando o rumo do dízimo. O pastor enriquecendo e ele continuando pobre, mesmo orando de hora em hora. Havia contribuído pro “templo” durante anos até o mês passado, fizesse a soma, era capaz de ter dado pra construir uma casinha. Mas ao mesmo tempo, Tomé sofria do enraizado pavor de que o demo lhe aplicasse considerável correção. Assim pensando, foi pra casa via costumeira picada de terra, que cortava caminho até a fazenda aonde morava e trabalhava, amontoando feno. No meio do caminho parou pra um xixi. Durante o deságüe, se atormentava sobre o poder de Satanás. Mas com tantos pecadores graduados, porque o diabo ia cismar justo com ele? Aí, lembrou-se do primo que se dera mal por ter transado com a cunhada, ignorando assim o pecado da luxúria e o poder do maligno.

De repente ouviu passos. Sentiu um arrepio, do cócix até o rodamoinho no alto da cabeça. Apressado recolheu o pinto, virou a cabeça e deu de cara com o os pés de cabra. O cão encarou Tomé e em tom grave gritou:

— OOOééééééééé”

Mas o mijão desatinou, e entendeu: “Tomééééééééé”. Enlouquecido, desembestou na carreira, caindo e levantando, pulando cercas escorregando em poças, tropeçando em pedras, disparando alarmes, até que sofreu enfarto do miocárdio na porta de sua casa. Esteve um mês hospitalizado e, quando o coração deixou, passou por cirurgias nos braços, pernas, coluna, bacia e nariz.

O das tinhosas botinas foi pego e preso: é solteiro, ricaço e mora só. Respondeu ao processo e vai ter que pagar $ 750.000,00 ao Tomé. E como também se recusou a esclarecer sobre sua intenção ao usar tais artifícios, ficará enjaulado até que o revele.

Cláudia Pacce

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