SELVAGEM

Eu tive um primo, Carlos Abilio Reis, que sobre mim, dizia: — Esta menina é selvagem...

De minha última vida na Terra, o que mais ficou gravado "na memória", foi a estrada que eu trilhava ao entardecer, do Templo à minha casa. Levando o irmão menor pela mão, era corajoso seguir aquele caminho selvagem; os tigres são raros no Sul da Índia, pois os veados, a comida preferida desse felino, também são raros pois apesar de existir a "jungle",  a relva é escassa no solo seco. Eu penetrei na "jungle" pelo lado e acima do Templo — mas o chão não é emaranhado como os das florestas braileiras.

Nós temos uma maneira de viver durante o dia e à noite. Mas, os animais "mudam" tanto de dia como de noite. Uma vez fui na casa de um biólogo na Tijuca, Rio, e  vi numa jaula uma jaguatirica, onça pequena: fiz-lhe carinhos e ela parecia um gatinho. Entardecendo, fui me despedir da oncinha — e voltei ao quintal. Ao me aproximar da jaula, a jaguatirica se enfureceu e se atirava sobre as paredes enteladas para me atacar. Eu jamais imaginara tamanha furia num pequeno animal selvagem.

A nossa selvageria é enfrentar o mundo com a civilidade da educação.

Porém a Noite e o Dia, para nós, são os periodos de encontros e desencontros com todos os aspectos da Vida. A Existência é obscura e clara, hipocrita e corajosamente franca e verdadeira. Não existem estradas para as Almas - só uma palavra: encontro. Poderia eu segurar a alma da jaguatirica e tentar apresentá-la aos Devas. Sei que só restariam seus olhos dourados, selvagens e preciosos como dois topázios — pois a Existência é formada por várias Minas de Tesouros.

Clarisse de Oliveira

« Voltar