Pernambucanadenses

               Quinta-feira, 27 de Dezembro de 2007

O primeiro dia em Montreal

Estivemos pela primeira vez em Montreal em 2004. Chegamos na noite do dia 1º de abril, o dia da mentira. E quase não acreditamos no que dizia o termômetro: 3ºC. Só podia ser brincadeira. A sensação era de -30!

Ficamos no Auberge de Jeunesse, (1030, rue Mackay, H3G 2H1) pertinho da estação de metrô Lucien-L'allier. Um albergue muito bom e bem localizado. Melhor do que ele só o de Quebec, que era quase perfeito.

Curiosamente, não gostei muito de Montreal quando estive lá. Digo curiosamente porque depois ela viria a ser a cidade escolhida por nós para viver. Talvez eu não tenha gostado muito porque não senti nas ruas o mesmo clima amigável de Toronto, que me deixou impressionado. E nem o mesmo céu azul. Nos cinco dias que passamos em Montreal, o céu esteve quase sempre cinzento. Também não gostei de encontrar tanta gente fumando nos bares por onde andamos. Pensamos que todo o Canadá era como Toronto, onde o fumo era de fato proibido em lugares fechados. Se isso era ser mais "europeu", eu começava a gostar mais do "american way".

Nos dois últimos dias, porém, minha primeira impressão da cidade mudou para melhor, muito melhor. Primeiro porque o nosso desejo de ver nevar pela primeira vez foi atendido; depois, como se isso não bastasse, fez um sol tão bonito que não dá pra descrever. O que marcou definitivamente a nossa passagem pela cidade foi podermos curtir toda aquela neve maravilhosa sob um céu espetacularmente limpo. O azul e o branco se juntaram num contraste tão bonito que mais parecia a bandeira do Quebec. Uma bandeira que parecia dizer "à bientôt!"

 

               Quarta-feira, 2 de Janeiro de 2008

Nossa chegada à cidade de Quebec

Nossa chegada à cidade de Québec foi meio complicada. Depois de uma longa viagem de oito horas de trem desde Toronto, chegamos um bagaço. Ou melhor, dois bagaços. O trem era muito confortável, a paisagem muito bonita, estresse zero... mas oito horas é muito tempo. Mesmo no maior conforto.

Eram quase nove da noite quando o trem chegou. Assim que saímos na rua, cheios de malas - quatro malas de puxar, mais duas pequenas a tiracolo, para ser mais preciso - percebemos que ventava muito. Era um vento forte, que para nosso espanto, derrubou a mais pesada das malas, que tínhamos colocado de pé enquanto decidíamos se íamos de taxi ou a pé para o albergue. Não bastasse o frio, ainda teríamos que enfrentar um furacão?

Consultamos nosso mapa, telefonamos para o albergue e resolvemos ir a pé. Antes tivéssemos pegado um táxi. Além da dificuldade de localizar o albergue - que só conseguimos depois que resolvemos pedir ajuda aos sempre prestativos canadenses (perdão; quebecoises). Uma vez localizado, ainda tivemos que subir ladeiras intermináveis carregando aquelas incontáveis malas que, a essas alturas, já pesavam pelo menos meia tonelada cada uma. Nunca vi tanta ladeira. Nem Olinda!

Já eram quase dez da noite quando finalmente chegamos ao albergue (Auberge Internationale de Québec - 19 Rue Ste Ursule, QC - G1R 4E1- Quebec) uma maravilha de albergue, justiça se faça. Hoje, quase quatro anos depois, só me lembro de nossa chegada. Não faço a mínima idéia do que aconteceu depois. Acho que caímos no sono. No dia seguinte começamos nosso passeio pela agradabilíssima cidade do Quebec. Mas isso é motivo pra outro post. ;)



               Sexta-feira, 16 de Maio de 2008

Tensão pré-Montreal

lNoites de insônia, programinha de contagem regressiva na tela do computador, dúvida, receio, indecisão. É a TPM, que — acredite — também atinge os homens. Há semanas eu venho sofrendo de Tensão Pré-Montreal.

Quem me conhece sabe o quanto eu sou apegado à minha cidade. Nunca me imaginei morando noutro lugar que não o Recife. E sempre disse isso pra todo mundo. Viver longe do Carnaval, do frevo, do maracatu, dos caboclinhos e do manguebit? Deixar pra lá o forró (o de verdade, por favor) e o São João? E o rio Capibaribe? E a praias de Boa Viagem, Porto de Galinhas, Serrambi? Ficar sem comer aquele siri-mole ao alho e óleo do Bar do Cabo, os caranguejos ao molho de coco do Guaiamum Gigante, os ensopadinhos de aratu e as agulhinhas fritas de Porto de Galinhas? Nem pensar. Passar sem os jogos do meu Náutico, logo agora que ele está na Série A pelo segundo ano consecutivo, depois de doze longos anos afastado? De jeito nenhum. Pior que tudo isso, só viver longe do meu pai e de minhas irmãs e sobrinhos. Não, de forma alguma, nem em pensamento!

Acontece que as coisas mudam. Há um ano realizei o meu sonho de ser pai, e agora tenho que pensar também no futuro do meu filho. Não posso mais pensar apenas no que é bom pra mim, mas devo pensar principalmente no que é melhor pra ele. E é por isso que em poucas semanas estarei partindo pra morar no Canadá, como imigrante. A cidade que escolhi? Montreal, aquela das Olimpíadas de 1976, que eu nunca pensei sequer em visitar.

Não vou em busca de dinheiro. Vou em busca de um lugar melhor para viver, onde possa ter um mínimo de segurança e onde as pessoas saibam o significado da palavra respeito — coisas difíceis de se encontrar no nosso país ultimamente. Pelo menos na minha cidade. E isso tem um preço: me afastar das coisas e das pessoas que gosto. Preço muito, muito alto.

Mas eu estava falando era da TPM. À medida em que a data da viagem se aproxima, ela aumenta. Checar todas as minhas coisas, separar o que levar, o que vai ficar e o que vou jogar fora... não é uma tarefa fácil. Tanto papel inútil que eu juntei (imagine só, eu tinha guardado o meu primeiro talão de cheques, de 1980!) que só olhar já me deixa cansado. E tem mais: separar CDs, DVDs, roupas, livros, fotos... tudo o que eu juntei nesses 46 anos... e fazer com que tudo caiba em apenas duas malas? É ou não é pra ficar com TPM?

O tempo é curto e há tanta coisa por fazer que não há como não ficar nervoso. Será que vai dar tempo de fazer tudo? Será que não vou esquecer de alguma coisa importante? E quando chegar lá?

Como vão ser os primeiros dias? Vou conseguir entender o francês “québecois”? E a ansiedade para escolher o melhor bairro para morar? Tem parque perto? E estação de metrô? Há alguma boa creche onde possa matricular meu filho? E como vai ser quando o tempo esfriar, daqui a alguns meses? Como vai ser quando fizer -20ºC? Só de pensar já sinto o frio: bem na barriga.

TPM é assim. Faz até a gente deixar de escrever. Ou escrever e achar que está horrível. Ou ainda pior: levar semanas pra escrever uma simples crônica e ainda assim não conseguir explicar direito o que é a tal tensão pré-Montreal. Quando ela passar, talvez eu consiga. Por enquanto vou tratar de combater a danada passando esses dias com a família e com os amigos. ;)

 

               Domingo, 10 de Agosto de 2008

¡Hay que to be polyglotte!

Lá vamos nós, eu e meu filho, no ônibus a caminho de casa. Brincalhão como ele é, sempre chama a atenção de alguém dentro do ônibus. Desta vez foram duas senhoras que se engraçaram dele e uma delas perguntou: "¿Cuántos meses él tiene?" A minha chave comutadora de idiomas é nova, ainda funciona muito lentamente, então eu demorei uns cinco segundos pra responder "Quince meses". O que seria fácil há alguns anos, pareceu muito difícil agora. Fiquei assustado.

Antes de descer do ônibus, uma mulher chegou perto de mim (o suficiente para que eu percebesse que ela tinha tomado umas e outras) e disse: "You have a nice baby! How old is he?" E lá vou eu mudar a chave de novo. Levei os mesmos cinco segundos até responder: "He's fifteen months old". Não satisfeita, ela completou com um "It's your first?" Ao que respondi, desta vez mais rapidamente, com um preocupado "Yes, yes!" É que o ônibus já havia parado e eu ia descer ali.

O motorista, atencioso como a maioria dos motoristas daqui, não reclamou. Apenas aguardou que eu me livrasse da simpática e ébria senhora e seguisse meu caminho até a porta. Eu, claro, agradeci com o tradicional merci beaucoup. "Bienvenue! Bonne journée!", disse ele. Sim, bienvenue, porque esse negócio de de rien é só lá na França. Aqui é bienvenue.

Aqui em Montreal, hay que to be polyglotte. Em um minuto podem falar com você em três idiomas diferentes. Pra eles é muito normal. Pra mim pode vir a ser normal um dia, mas eu vou ter que passar muita graxa na minha chavezinha comutadora de idiomas.

Meu espanhol de universidade estava esquecido no fundo do baú. Meu inglês, que era até razoável, foi deixado de lado há alguns anos para dar lugar ao francês - necessário para o processo de imigração. O resultado dessa confusão é que eu não posso mais dizer que sou muito bom em nenhum dos três idiomas. Até em português eu estou me complicando, pois de repente descobri que não sei o que é feito do trema (alguém pode me dizer?).

Definitivamente eu não sou um poliglota. Mas um dia eu chego lá. ;)

À bientôt! Bye! Hasta luego! Arrivederci!

Inté!

 

               Quarta-feira, 19 de Novembro de 2008

Detesto esses choques

Todo dia, aqui em Montreal, eu digo um monte de palavrões. Mas não é só por causa dos ônibus da STM ("Societé de Transport de Montréal") não. Tem uma coisa que me aborrece ainda mais do que eles: os choques. É, é isso mesmo: aqui a gente leva choque todo dia, vou logo avisando. Claro que há as exceções, tem gente que nunca levou choque, mas infelizmente não estou nesse grupo de privilegiados.

O negócio é o seguinte: se a gente vai pressionar o botão do elevador, leva choque. Se vai abrir a porta e toca de leve na maçaneta, leva choque. Se bate em alguém, leva choque. Empurrando carrinho de supermercado então... é um choque atrás do outro. E tome palavrão! O choque já é ruim; juntando com o susto faz a gente virar uma bomba. Uma bomba de nervos. Um choque, uma explosão. Normalmente seguida de um ou dois palavrões, claro.

Hoje pela manhã eu fui pentear o cabelo e quando aproximei a mão da cabeça os cabelos ficaram em pé. Afastava a mão, os cabelos baixavam. Aproximava, eles levantavam. Coisa mais estranha. Eu devia ter filmado. Ah, antes que me perguntem: eu não testei em outras partes do corpo.

Hoje à tarde, na aula de francês, levei o maior choque no quadro (ou lousa, ou tableau, sei lá). A professora tinha me chamado pra escrever uma frase e, na hora que eu toquei no danado pra pegar o pincel atômico, foi aquele susto. Mas o susto foi tão grande que a professora se assustou também. Coitada, ela ainda pediu desculpas. Como se fosse ela a culpada.

Soube que a real culpada por tudo isso é uma tal de eletricidade estática, que eu nem me lembrava mais que existia. Tenho uma vaga lembrança de ter sido apresentado a ela quando fazia o segundo grau, mas não tenho certeza. Acho que eu esqueci porque em Recife não tem esse negócio não. Ou, se tem, não funciona. Ainda bem.

%@#$%#!!! Eu detesto levar choque!

Alguém sabe se existe luva de borracha?

 

               Quinta-feira, 4 de Dezembro de 2008

-9ºC

A manhã dessa sexta-feira vai ficar na história. Pelo menos na minha história. O site Meteomedia avisa que vai fazer um solzão, mas a temperatura vai chegar a -9ºC. E não é só isso não. É -9 Com sensação de -15!

Fico aqui imaginando como será a sensação de -15. Será que a gente consegue andar? Pensar? Respirar? Brincadeira, claro. Se a gente estiver bem agasalhado o frio não incomoda. Mas pra quem é "novato" em matéria de inverno canadense, o problema é justamente saber se agasalhar.

A menor temperatura que já alcancei foi -6, há quinze dias, enquanto assistia a um desfile de Natal no centro de Montreal. Eu estava com três calças, duas camisas e mais o casaco. O frio no rosto era suportável, mas minhas mãos quase congelaram: é que eu passei uns dez minutos sem luvas, enquanto tirava umas fotos. Era como se eu tivesse colocado minhas mãos dentro de um freezer! Corri para o banheiro mais próximo, abri a torneira de água quente e deixei minhas mãos uns 30 segundos ali, para que elas voltassem ao normal.

Amanhã vai fazer -9. Com sensação de -15.

Tô me sentindo como um pingüim.

E o inverno nem começou ainda! ]

 

               Segunda-feira, 8 de Dezembro de 2008

-20ºC

(com sensação de -30)

Confesso que tomei o maior susto quando acordei na manhã da segunda-feira, dia 8. O vidro da janela parecia estar rachado, mas eram apenas pequenos riscos de gelo que tinham se formado. Ainda bem. Depois, outro susto: ao olhar para o rio Saint-Laurent, o que eu vi foi um monte de fumaça branca saindo das águas, um verdadeiro nevoeiro. Estranho, muito estranho.

Corri pra ligar a TV no canal do Tempo. A previsão era de -16ºC, mas fazia -20! Incroyable! Mas frio não é desculpa pra não sair de casa (pelo menos não no Quebec) e lá fui eu enfrentar o medonho. Um metro fora de casa e já deu pra sentir que não era brincadeira. -20 com sensação de -30! Não dá pra descrever direito o que é isso, só sentindo na pele. Se bem que eu não senti nada, pois estava todo dormente. ;)

Brincadeira. Mas -20ºC não é tão ruim quanto eu pensava que fosse. Tenho um casaco não muito sofisticado, que custou apenas 35 dólares, e ele me serviu direitinho. Não senti absolutamente frio nenhum. Pra não dizer frio nenhum, senti um pouco nos pés (ainda não comprei minhas botas de inverno) e um pouco no rosto, mas só quando o vento batia de frente. Em resumo: mesmo sem estar vestindo o que o "manual do novato" manda vestir, não tive muito problema com o dia mais frio que já vivi até hoje. Pensei que ia ser o fim do mundo, mas não vi muita diferença entre -20 e -5, por exemplo.

Não sei se a sensação de frio pode ser maior do que essa, mas espero não ter que encarar temperaturas menores. ;)

 

               Terça-feira, 13 de Janeiro de 2009

De 0 a -21ºC em dez horas

São dez horas da noite da terça-feira. Neste momento a temperatura aqui em Montreal é de -1ºC. Está até quentinho, já que a média dos últimos dias tem sido -10, mas daqui a dez horas (mais precisamente às 8 da manhã), ela cairá para -21ºC. Isso mesmo: -21ºC! Uma queda de vinte graus em apenas dez horas. Incroyable! E vai fazer o maior sol, como na foto do laguinho congelado aí embaixo. Imagine só que incoerência...

Mas o perigo não pára por aí: é provável que a temperatura venha a cair mais doze graus, podendo chegar a -33ºC na noite da quarta-feira. Ainda tem a tal de "sensação térmica", causada pela força do vento. Mas dessa eu não vou nem falar, pra não entrar em pânico. Melhor parar por aqui.

Se o mundo não congelar, amanhã eu volto. À bientôt!

Felipe Holder

Trechos do Blog Pernambucanadenses: http://pernambucanadenses.blogspot.com/
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