EMBALAGEM
Ela me embalava, me dava conselhos, me mostrava as opções do dia, se pudesse vestia-me a roupa e me escovava os dentes.
E assim fui me deixando ficar nesses embalos, o certo é que já nem sabia o que fazer se ficasse sem ela um dia.
E como as coisas se acabam foi-se também acabando a vontade de ficar com ela, de me deixar embalar.
Dali por diante uma tremenda raiva foi tomando conta de mim toda vez que ouvia sua voz.
Porque eu sabia mais do que ninguém que aqueles embalos estavam me fazendo perder aos poucos o único desejo que jamais tive na vida.
P. J. Ribeiro
Do livro: Contos sob suspeita, Totem Edições, MG, 2008