Pássaros, ondas e flores

Era um trajeto ao qual se acostumara nos últimos anos. Podia ouvir nitidamente o canto dos pássaros, o som das ondas de encontro às rochas, ao mesmo tempo que se inebriava com o aroma das flores.
No entanto, naquela manhã, sentiu algo diferente no ar. Passos a seguiam. Quem seria, em pleno amanhecer de uma segunda-feira qualquer?
Subitamente, ouviu uma voz masculina que, a princípio, não conseguia identificar:
— Helena...
Ela seguiu, sem responder nada. Não queria interrupções em sua rotina. A mão que firmemente segurou seu braço causou-lhe arrepios.
— Por que não me olha, Helena? Há quantos anos anos não nos vemos! Por que fugiu, sem nada dizer? Responda...
Havia ansiedade naquela voz. Helena percebeu que era Marcelo, pois jamais esqueceria aquele perfume de fragrâncias amadeiradas. Ele fora o grande amor de sua vida, mas temendo enfrentar a situação, apressava os passos. Nunca lhe dissera o motivo pelo qual o abandonara, preferindo que Marcelo ficasse com a sensação do desamor. Não tinha a mínima ideia de como ele a encontrara, mas sabia que, daquele momento em diante, buscaria outros rumos para que continuasse a viver em paz consigo mesma.
Como doera saber que nunca mais voltaria a fitar seus olhos! E, mesmo agora, como queria de volta possibilidades tão ricas que lhes foram subtraídas! Muitas vezes sentira vontade de acabar com a vida, inconformada com a sentença daquela eterna escuridão.
Refletindo sobre os acontecimentos dos últimos anos, sabia que não poderia permanecer, mesmo que isso significasse a volta daquele vazio com o qual convivia no seu dia a dia: um descomunal e contínuo esforço mental para que não perdesse na memória os rostos amados, as nuances do céu, do mar, das flores tão plenas de vida.
— Helena, sei de tudo o que lhe aconteceu. Nada teria mudado para nós!
A vida se transforma constantemente, e a nós cabe a adaptação a essas mudanças. De agora em diante, não pense mais em fugas ou separações. Vamos viver a vida tal qual ela se apresenta.
Ela balança a cabeça negativamente, faz menção de prosseguir, mas a voz dele é amorosa e convincente. Helena começa a afagar o rosto do amado e, com os dedos, busca capturar sua expressão, como se tentasse resgatar
aquele passado distante, cujo roteiro mudara drasticamente. Abraçam-se e o amor parece transbordar, excluindo quaisquer barreiras.
A partir de agora, ambos buscam um só caminho. Helena visualiza mentalmente um céu azul, os raios de sol e exclama, feliz:
— Que lindo dia! E, abraçados, sorriem, confiantes nas cores infinitas que habitarão para sempre o universo interior de Helena.

Belvedere Bruno

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