Análise despretensiosa de um poema de Drummond

Eis que um amigo me fala deste poema, “A Puta”, de Carlos Drummond de Andrade. Ficara machucado com ele, e pergunta-me minha opinião sobre o mesmo. Não o conhecia; fui lê-lo. É desses que não sairia em qualquer periódico com facilidade, mesmo quando Drummond já era Drummond! pois corta como faca ou caco de vidro. Mostra também, e em parte, o arcaísmo de uma época onde sexo era um pecado, um ato relegado a antros escuros muitas das vezes, a esquinas e becos sinistros, que queimavam a boca e a língua das pessoas, só de mencioná-los...

A poesia fala do instinto, esse sempre presente no homem, porque animal. Revela “o desejo”, universal (salvo sublimações, racionalizações e situações afins), e também mostra a hipocrisia e o preconceito. Hoje em dia é um pouco diferente: meninas de doze, de treze anos, dormem e vivem com os namorados sob o mesmo teto da mãe ou dos pais. Desde cedo, em várias ocasiões, procuram engravidar. Noto isso particularmente nas classes baixas, o que atribuo à falta de perspectivas e de horizontes. Uma busca de identidade... Não que a nova situação seja benéfica à pessoa, à sua família, à sua prole ou à sociedade, nada disso. Quero apenas dizer que muita coisa de fato mudou.

Voltando ao poema, a referida prostituta não é uma pessoa; é um símbolo. Não é Ana ou Maria, ou Ivete; é “a” puta, a única, “aquela”, a especialista em fazer justamente “aquilo”. Não tem rosto, não nem face, só cabelos enormes que simbolizam a sexualidade, animalidade; é uma máquina de prazer, de sexo. A boca será úmida, voluptuosa e mesmo que desdentada parecerá ter dentes, quiçá bem cariados, ou até mesmo mucosa com cancros sifilíticos. Ela é assim. Por outro lado, é interessante como o autor mostra, em determinado verso, a volúpia, num jogo de palavras semifrenético, que pode sugerir a fantasia solta rolando na masturbação, ou até num ato sexual. Porque, ao imaginar o objeto (a prostituta), o menino pode estar fazendo outra coisa. E essa “outra coisa” não exclui totalmente nem mesmo um intercurso homossexual.

Foram esses aspectos que notei no poema.

Eloah Margoni

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