MINHA ESTRÉIA NO MARCANÃ

          O Estádio do Marcanã foi inaugurado no dia 16 de junho de 1950, com um jogo de futebol entre cariocas e paulistas. Resultado: os cariocas perderam por 3x1, gol de Didi. Atuei na preliminar, num dia de muito sol, e explico. Houve uma grande festa de inauguração da praça de esportes (a maior do mundo) que abrigaria a desputa da Copa Jules Rimet.
          Nas arquibancadas ainda podiam ser vistos enormes andaimes, limitando a lotação daquele gigante de cimento armado. O tempo, impiedoso, conspirou contra os construtores e o estádio começou a funcionar assim mesmo.
          Volto à preliminar para lembrar que dezenas de atletas amadores desfilaram pelo gramado verde e palco futuro de grandes emoções. Como nadador do glorioso América F. C., lá estava eu, de calção e gorro vermelhos, aos 14 anos de idade. Não poderia imaginar maior alegria.
          Depois da volta olímpica, fomos alojados no fosso, de onde foi possível assistir ao jogo de forma inusitada: nossos olhos apenas alcançavam as pernas dos jogadores, sendo impossível imaginar qualquer jogada em conjunto. Mesmo assim, a cada gol do Rio de Janeiro, um salto para comemorar. Lembrança inesquecível.
          Veio a Copa do Mundo e o Brasil estreou derrotando o México, por 4x0. Não pude ir ao jogo, pois fui escalado por meus irmãos para vender o jornal Novos Rumos à porta do Maracanã. Via aquela multidão entrando apressada e nada de vender o jornal. Dei o meu primeiro golpe de marketing: Serve para ler e para sentar!" Foi um sucesso, pois as arquibancadas eram muito ásperas (falta de acabamento).
          Já nos jogos contra a Suécia e o memorável contra a Espanha, duas goleadas, estive presente. Jamais se poderá esquecer aqueles 100 mil torcedores cantando "fui às touradas em Madri", enquanto Zizinho, Ademir e Jair Rosa Pinto davam um show de bola, compondo talvez o nosso melhor ataque de todos os tempos. Sei que vão me falar de Pelé, mas como aquele trio nunca vi.
          No dia da decisão, 16 de junho de 1950, acordei com pressentimento de que não deveria ir ao estádio. Nem pra vender jornal. Fiquei em casa, ouvindo pelo rádio e participei da generalizada tristeza quando se confirmou a derrota. Morava na rua Dr. Satamini, na Tijuca, caminho de volta do Maracanã, e nunca vi tamanha choradeira na minha vida. De que, aliás, também participei.
          Depois, defendeno as seleções do rádio (trabalhava na Rádio Clube do Brasil, com Raul Longras) e da imprensa (Última Hora) joguei no Maracanã, experimentando uma indizível sensação. Lembro que o locutor Orlando Batista, da Rádio Mauá, quis devolver uma bola e o seu calção rasgou de algo a baixo, arrancando gargalhadas de uma imensa platéia. Já imaginaram?
          Joguei também naquele tapete verde e fofo pelo torneio universitário, defendendo as cores da minha Faculdade de Educação da UERJ. De tudo isso, que agora recordo, resultou a feiura de três gols históricos, um de penalty, nas mesmas balizes e redes em que tantos craques brilharam. Lá deixei também minhas marcas. Não é uma glória?

Arnaldo Niskier

Do livro: A árvire da educação, Col. Afrânio Peixoto da Academia Brasileira de Letras, ABL, 2000, RJ

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