Quarenta anos do martírio de Ernesto Guevara de La Serna

Há quatro década, precisamente em oito de outubro de 1967, Ernesto Guevara de La Serna , argentino natural de Rosário, nascido no ano de 1928, era executado na Bolívia pelo militar Gary Prado Salgado, em insalubre salão de uma escola da localidade de Higueras. Um dia antes havia enfrentado sua última batalha, acompanhado por diversos veteranos da famosa coluna Ciro Redondo, notabilizada pela forma sensacional como dominou Santa Clara, importante cidade cubana, em dezembro de 1959, quando da revoluçaõ castrista que derrubou a ditadura sanguinária de Fulgêncio Batista.

Guevara foi imortalizado pelos companheiros cubanos devido ao uso profuso de pronome pessoal característico da região pampeira argentina, legado dos índios guaranis que foi incorporado ao idioma castelhano falado em sua terra natal. " Che", formado em medicina, destacou-se por abraçar radicais ideais em prol da libertação humana.

Incorporado ao Granma, quando do retorno do grupo castrista a Cuba, Guevara tornou-se lendário devido as estratégias adotadas quando de comando da coluna que o seguiu para o Congo, no continente africano, bem como para os últimos combates no altiplano andino boliviano.

A firmeza de princípios transformou " Che" em figura ambígua, louvada e contestada, pois, inegavelmente, portou-se de forma radicalíssima em diversas oportunidades, principalmente quando do ensejo implementado pela revolução cubana, sendo responsável pela execução de centenas de prisioneiros nos famosos "paredóns" que marcaram e simbolizaram época em Cuba. Apesar da postura radical, " Che", nem outros dirigentes cubanos, nunca importaram-se efetivamente com o fato de que o corrupto e sanguinário ditador passou a morar bem próximo do arquipélago caribenho, desfrutando de todas as regalias em ilha particular adquirida com dinheiro do povo, tendo vivido em paz os restos dos seus dias sem ser importunado pelos justiçamentos perpetrados pelo governo de Fidel Castro.

Antes de partir para a Bolívia, Guevara adentrou as florestas do Congo, lutando contra as tropas mercenárias de Moses Chambe, as quais se empenhavam em desestruturar lutas nacionalistas. A áfrica enfatizava importantes reflexões no guerrilheiro latino-americano em razão de sua conjuntura e de sua história repleta de crônicas reacionárias em favor da intransigente elite européia que a explorou à exaustão.

Sensível aos problemas da humanidade, Guevara lutou em prol da efetivação do gênero humano, razão pela qual, em consonância com seus propósitos estratégicos, escolhera a Bolívia como palco de suas últimas batalhas. Terra em que a exploração atingiu níveis estratosféricos, tendo abrigado ricas reservas de pratas em Potosí, a Bolívia apresentava, em sua concepção, condições necessárias para a deflagração da revolução latino-americana.

Atrasada e estrangulada em sua forças produtivas, a Bolívia seria o lócus ideal para implantar célula guerrilheira. "Che" não dimensionou revés que as condições naturais do país poderiam provocar em sua corajosa coluna. Com a ajuda do governo cubano, Guevara foi dado como morto na República Dominicana, pois a polícia de Fidel havia introduzido, no gabinete do ditador Trujillos, documentos que atestavam a morte do guerrilheiro nas ruas de San Domigos. A entrada de Guevara na Bolívia também foi favorecida pelos esquemas castristas, pois, disfarçado de economista uruguaio, consultor da OEA, estabeleceu-se em território quase desconhecido. Membros da coluna Ciro Redondo sentiram de imediato os efeitos da ausência de oxigenação nas ruas de la Paz , em vista que muitos desmaiaram por não estarem acostumados com as difíceis condições naturais andinas. Guevara constatou que o altiplano era radicalmente diferente da Sierra Maestra.

As primeiras escaramuças foram favoráveis à célula guerrilheira, mas abismados com a perícia dos traquejados componentes da coluna Ciro Redondo, as forças armadas bolivianas solicitaram ajuda norte-americana. Há probabilidade de que os guerrilheiros tenham sido localizados graças ao rastreamento feito por satélites.

Identificada a presença da guerrilha comandada por Guevara na Bolívia, deslocaram-se para a América do Sul vorazes vingadores, representados pelos implacáveis anti-castristas que haviam se refugiado nos Estados Unidos, sedentos de revanche em razão das inúmeras execuções ordenadas pelo guerrilheiro quando desfrutava prestígio inabalável na ilha insurgente. Os ianques disponibilizaram todas as condições para que a Bolívia se transformasse no último momento de suas lutas.

Capturado pelos boinas verdes quéchuas, Guevara se portou estoicamente, resignando-se ao destino que as tropas bolivianas, assessoradas pela CIA, haviam lhe reservado. Seu martírio tornou-o lendário.

Apenas o comandante da expedição militar que aprisionou e executou " Che" ainda vive, pois o restante teve morte trágica, provavelmente caçada pelos admiradores do guerrilheiro argentino que marcou indelevelmente as lutas do povo oprimido do planeta terra.

Ernesto Guevara de La Serna , símbolo da rebeldia e do radicalismo de gerações, ícone da liberdade, continua vivo no imaginário de milhares de pessoas espalhadas pelo planeta, pois a lenda sobreviveu ao homem, reservando-lhe espaço em galeria na qual se sobressaem àqueles que empenham a própria vida em defesa dos seus ideais.

José Romero Araújo Cardoso

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