COLUNA DE VÂNIA MOREIRA DINIZ

Nº 5 - 6/10/2006
(próxima: 21/10/2006)

          

O comportamento que mudou vidas

Hoje com a tecnologia, ignoramos os problemas e as dificuldades de outros tempos. Imagino que não podemos passar sem a conexão perfeita da internet em nosso computador. Mas essa história contada, pelo descendente de uma pessoa muito especial, emocionou-me pelas dificuldades e porque mulheres como essa indubitavelmente, fizeram o mundo caminhar.

Bil Gates ou outros não teriam chegado à genialidade se não fossem pessoas simples e corajosas que primaram por enxergar o futuro escuro e sem horizontes: Os heróis ocultos.

Por volta do ano de 1910 um casal tivera muitos filhos numa fazenda do interior de Minas. Distante, sem os meios de comunicação que dispomos e nem a civilização próxima, uma senhora que não tinha outra atividade senão de uma vida humilde e doméstica contemplou a natureza e pensou o quanto tudo estacionaria ali se não houvesse progresso.

Seus inúmeros filhos seriam simples e pequenos fazendeiros a tirar da terra seu próprio sustento. Alguns poderiam ficar revoltados e infelizes ou trilhar uma estrada dolorosa. E pensou como era injusto que eles não tivessem o direito de optar pelo conhecimento, apenas porque não havia os meios para isso num lugar ermo e sem condições. Ela estudara nove meses e sabia ler, escrever o necessário e contar, mas almejava para outra geração muito mais. A vida não podia parar indefinidamente até que o progresso chegasse.

Inúmeras crianças cresciam também nos arredores. Tudo isso passou pela sua cabeça dias e meses a fio até que desejou procurar uma autoridade.

Uma manhã que amanhecera premida pelos sonhos, montou em seu cavalo, à caminho da cidade. Era longe, mas chegaria lá. Iria até Contagem e daí tomaria o trem para a capital.

Chegando ao seu destino dirigiu-se ao palácio do governo e sem nenhuma vergonha e com altivez pediu ao funcionário que ali estava para falar com o governador do estado.

Naquela época tudo era mais fácil em relação às autoridades e pelo menos nos estados eles se chegavam com mais facilidade até seu povo. A pessoa que a atendeu perguntou o que ela desejava.

Vendo uma senhora bonita e simples, decidiu ajudá-la. - Preciso falar com o governador, moro no interior, numa fazenda e quero que lá tenha uma escola. Abro espaço na minha fazenda para que a instalem.

O homem ficou a olhá-la sem no começo compreender palavras tão sérias vindas de uma mulher destemida, mas desconhecida e decidiu realmente ajudar aquela pessoa. Visionária ou não, merecia uma resposta. E sabemos o quanto a mulher naquela época não tinha força suficiente para ser ouvida com credibilidade.

Orientou-a serenamente afirmando que ela devia procurar o secretário de educação. D. Josina, enfrentou o olhar duvidoso do seu interlocutor:

- E quem pode me levar até lá? Observando-a decidida e sentindo uma profunda admiração naquele momento depois de saber sua singela história decidiu levá-la ao Secretário.

D. Josina ficou longo tempo até que um auxiliar resolveu ouvi-la. A verdade é que o Secretário de Educação se entusiasmou por aquele projeto proposto por uma mãe que não havia estudado nem um curso completo, vivia no interior, mas tinha a clarividência de enxergar o porvir de uma maneira tão concreta.

Ela dizia:

- Excelência, quero que meus filhos possam escolher seu destino e ter cultura, estudar, conhecerem um mundo diferente, mesmo que depois decidam ficar trabalhando lá.

- E na Fazenda há condições de instalar condignamente uma professora e possuirá dependências para ter uma sala de aula?

- Sim, excelência, eu lhe garanto que sim. Só não temos condições de ver crianças inteligentes, sem estudar e sem planos para o amanhã. Somos pequenos fazendeiros, mas temos condições de receber com dignidade algumas professoras e oferecer dependências necessárias. Mas, se duvida, podemos ser visitados.

- Pois então, D. Josina eu autorizo com muito orgulho a escola em sua fazenda, sinto-me feliz de conhecer uma patriota em defesa do Brasil de amanhã. Foi criada uma escola na fazenda e alguns professores passaram a fazer parte desse objetivo. Tudo cresceu para esse clã e outras famílias que moravam nos arredores.

Iniciou-se enfim a marcha para o futuro. As crianças faziam o primário e partiam para a cidade mais próxima, ficavam em casas de parentes e continuavam seus estudos.

Assim só na família de D. Josina muitos se tornaram professores, advogados, um padre e outros que seguiram diversas estradas, mas estavam aptos a escolher seu destino.

Um grande professor e advogado que me contou essa história, neto dessa magnífica mulher em suas reflexões pergunta-se continuamente se não fosse a perspicácia de sua avó onde ele e dezenas de pessoas que já passaram seu conhecimento para outras, estariam nesse momento.

Claro que é um orgulho cuidar da terra, mas foi dado a seus descendentes, amigos, vizinhos o direito da escolha livre. E hoje esses descendentes que primam pela cultura e pelo saber e ajudam o país com seu conhecimento poderiam estar simplesmente segregados numa vida que não desejavam e sem o horizonte, luz e perspectiva de qualquer crescimento.

Enalteço nessa crônica D. Josina cujos ideais vieram do altruísmo, de sonhos que entregara com fé a seus descendentes e que é responsável pelo progresso do país bem como nossos grandes inventores ou gênios. E o neto de Dona Josina pergunta seguidamente: Se não fosse a coragem e iniciativa de minha avó quem seria eu?

Observação: D. Josina Matos com o pequeno fazendeiro Sr. Zeca tiveram 21 filhos dos quais 13 sobreviveram.


Colunas anteriores:
01, 02, 03, 04

Coluna de Vânia Moreira Diniz