POR QUE [NÃO] DEVEMOS ATIRAR O PAU NO GATO?

A minha esposa é uma educadora adepta dos ensinamentos de Paulo Freyre e tem uma visão um tanto sofisticada das metodologias básicas de ensino. No ano passado, orientando o nosso filho Vinícius em suas tarefas escolares, na época com seis anos e estudando a primeira série do Ensino Fundamental, ficou revoltada com a caça ao gato proposto na tarefa. Imediatamente pegou o telefone e ligou para a coordenadora pedagógica da escola, em protesto contra o texto apresentado, que era, nada mais nada menos, a cantiga de roda “Atirei o pau no gato”, cujos versos instigam as crianças a cometerem malvadeza contra os bichanos.
Ante a atipicidade da situação, uma pergunta inevitável pairou no ar: como se educar uma criança sem que ela sinta respeito e responsabilidade pelos animais? Por que se atirar o pau no gato assim, sem mais nem menos, vez que os gatos são animais totalmente inofensivos, dóceis e carentes de afeto? Por que atirar o pau no gato e ainda se espantar por que o mesmo não morreu? São cantigas de roda desse mote dos tempos medievais, que o homem não tinha referência para moldar um refinamento do seu caráter e vivia em eterna luta para se livrar da violência do meio exterior, que ainda se tenta absurdamente se aplicar nas comunidades escolares, posto ser inqualificável e inadmissível nos dias de hoje, em que a maturidade humana atingiu um grau superior de evolução e tem a sua personalidade formada e desenvolvida por meio de modelos educacionais cientificamente estudados, cujos processos foram satisfatoriamente avaliados na sua aplicabilidade nos primeiros anos de sua infância e juventude.
Devemos ensinar aos nossos filhos, desde pequenos, o valor de se viver em harmonia com os animais e a natureza em si e que, com eles, formamos o ciclo da vida, o triângulo da concórdia mais importante para a sobrevivência do próprio planeta Terra. É através do respeito praticado aos animais e, por extensão, à natureza, que o menino de hoje vira homem amanhã sabendo respeitar e valorizar a vida.
O homem é fruto do meio em que ele se cria. Se as crianças são estimuladas a cometer barbaridades contra seres inocentes e inofensivos, certamente serão adultos violentos, pois, em vez de freio para a perversidade latente, tiveram incentivos para a crueldade petulante. E depois os pais levam as mãos à cabeça e choram indignados se perguntando onde foi que erraram.
É que o pau que atiraram no gato, inexoravelmente voltou-se contra eles.
E dona Chica se admirou com o berro dorido que os pais deram. Formou uma roda de crianças e cantaram uma nova versão:
“Não atire o pau no ga-to-to
Que o ga-to-to
Não fez na-da-da.
Dona Chi-ca-ca
Admirou-se-se
Como o gato, como o gato
É camarada!”
– Miaaauuuuuuuuu!

Ronaldo Torres