Dois poemas com gato
falta-me um gato
para fazer festas às palavras.

algumas chegam entre mãos
na carícia breve da madrugada.

enquanto não parto para ítaca,
viajo, aguardo circe
que me transforme em felino agudo.

depois é só encostar-me às pernas
e fitar-me
eu, nariz aquilino, olhos rasgados em mim
na verticalidade da íris;
lamber os pelos, a pele,
arquear o corpo na languidez do gesto.

ficar à espera que a palavra cresça.

abril 2002


 

o rabo do gato desenha
letras árabes no mosaico da sala.
arranha o tapete de arraiolos,
rasga o jornal de letras
e um verso escapa-se pela janela entreaberta

uma pétala de violeta
              é o tempo das violetas
fugiu para a janela da vizinha
um andar abaixo.
talvez atraída pelo cisne de camille saint säens
no carnival des animaux

o gato enfurece-se com o silvo do vento
e quase me estraga o poema.
             vale o método tradicional
um novelo de linha encanta o gato.

alguém pousa os lábios nos meus olhos.

                                                                               José Félix

abril 2002


Leilagatos