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JORNALISMO LITERÁRIO OU LITERATURA JORNALÍSTICA?

A história da literatura tem início quando o homem começa a contar histórias em volta da fogueira, ao voltar da caça que o alimentaria e à sua família, muito antes que se pudesse falar em cultura ou civilização. Mas, por contraditório e estranho que pareça, já se pode falar em literatura e jornalismo, nesta época. Afinal, qual a diferença entre contar como foi enfrentar um terrível e enorme animal para matá-lo, ou uma tempestade violenta ou, mesmo um sol inclemente, e as notícias do Jornal Nacional? Serão elas, por acaso, tão diferentes da mazela de nosso homem pré-histórico e sua luta pela sobrevivência? E será que no meio da turma que se reunia para ouvir suas histórias não havia, de forma embrionária e primitiva, todas as realidades que temos hoje, talvez até uma "internet" que permitia a comunicação entre diversas cavernas? Enfim, da mesma forma que nós adultos, já fomos bebês, nossa espécie já teve sua infância, mas sempre com muitas histórias para contar e ouvir, já que elas são o grande alimento de nossa mente e alma e é por isto, que por mais que se preveja a morte da literatura, ela nunca acontecerá - ao menos enquanto houver um ser vivo e pensante sobre a terra.

Pousando nos dias de hoje, percebemos que há autores e teóricos da literatura que gostam de fazer a dicotomia entre literatura e jornalismo, o que nos parece absurdo, a partir do momento que percebemos que os dois são relatos do cotidiano (ou eternidade) do homem, onde a única diferença é a forma em que os acontecimentos estão colocados: o literário com a permissão do uso do adjetivo, e o jornalístico mais seco, talvez até formal, mas sempre livre e imaginativo, pois usa a linguagem do dia-a-dia, que encontramos em todas as esquinas, armazéns e cafés. Enfim, a linguagem humana.

Quanto a literatura, ela não poderia ser mais jornalística, pois por mais que sua narrativa se distancie da realidade, ela traz em si o elemento da atualidade, já que todo autor vive num determinado momento histórico e dentro de uma paisagem geográfica que o denuncia como hodierno, por mais que queira fugir deste fato, refugiando-se na história de antigamente ou do futuro.

Literatura e jornalismo são - se me perdoam o lugar comum - as duas faces de uma mesma moeda, a da narrativa da tragédia humana e, suas minúcias, miudezas, intimidades, grandezas e mesquinharias, amores e ódios, vida e morte, infância e velhice, enfim, da história desta nossa raça tão infeliz, que nasceu com o trágico destino de ser o único animal que sabe que vai morrer, acabar . Este único ponto já seria suficiente para nos jogar no abismo da depressão, mas ser humano é algo tão divino que, ao contrário, nos impulsiona na busca do infinito.

Marli Berg (*)
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(*)  Jornalista, crítica teatral, foi colunista literária de "Ele Ela", "Manchete", "O Globo" é colunista de nossa revista eletrônica Blocos Online (coluna "Livros em Blocos") e autora de romances de fiçcão.