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ISENÇÃO, ESSA QUIMERA
Quando se afasta
da Literatura, o Jornalismo perde o melhor de si.
Literatura e Jornalismo
são como lã mesclada, fios tênues que se confundem
e mudam de nome sob o crivo do tempo, sob a ótica da História.
O que é bom permanece. A escrita imediatista, descartável,
é um mal necessário que cumpre seu papel de informação
rápida, fast food, venda fácil e, assim como veio,
vai-se embora.
O exercício
de classificar o que é uma e outra coisa aguça a percepção
dos estudiosos, porém seus resultados são vulneráveis
como a Ciência. Só o que é bom e foi divulgado
permanece.
A isenção,
essa quimera. Estamos todos envolvidos, como a lente, o diafragma
e a imagem captada, sumo do acaso e da intenção. Da
mesma forma, fato e ficção. Todos inseridos no contexto
de nosso tempo e suas respectivas perspectivas. Há momentos
em que certa cor prevalece, há momentos de brilhante equilíbrio,
como o livro Estação Carandiru, de Dráuzio
Varella.
Há o jornal
que vira papel de embrulho e há crônicas, carta de
leitores, colunas de opinião recortadas, guardadas,
repassadas de amigo em amigo por e-mail, nessa imensa teia virtual
que replica o que é do nosso agrado, o que nos toca, e queremos
compartilhar a emoção, a indignação,
a notícia, numa inesgotável cadeia.
Há livros
no lixo. Há excelentes livros em camelôs improvisados.
Aqueles que abandonamos quando mudamos de casa. E aqueles que relemos
e releremos durante a vida inteira como quem visita um velho amigo.
No dia 7/6/76,
a Revista Status publicou uma edição especial com
vinte e cinco contos brasileiros, enquanto promovia concursos anuais
de contos eróticos, revelando talentos. Iniciativas como
essa enchem meu coração de nostalgia. Não houve,
então, intuitos classificatórios, mas um caloroso
abraço entre o Jornalismo e a Literatura. A obsessão
pelo novo, hoje em dia, inviabilizaria essa proposta.
Opiniões controversas
são muito mais ricas que o mero relato. Às vezes,
as notícias acabam tão parecidas umas com as outras,
que lemos e esquecemos. A corrupção de ontem é
a mesma de hoje. Os celulares usados abertamente no presídio,
quando foi que eu li esta notícia? O fato é abandonado
como se celulares fossem sempre usados abertamente em presídios.
Parece até que é legal celulares serem usados dentro
de presídios. Afinal de contas, é um fato do dia-a-dia.
Ao que tudo indica, impossível de ser evitado. Vamos conversar
sobre isso?
É a polêmica,
e não a constatação, a mola propulsora da boa
escrita como instrumento de transformação. Não
importa o rótulo, se é Jornalismo ou Literatura. Importa,
sim, que não sejam palavras rasas de superfície, e
sim de aprofundamentos corajosos, frutos de dúvidas, nunca
de certezas absolutas. Mais importantes que os fatos, são
as análises deles. Delas podemos extrair a luz para apontar
um novo caminho, de mudanças, de reflexões que construam
alicerces para um mundo melhor, sem tantos enfrentamentos.
Glória Vasconcellos Horta (*)
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(*) Fez Faculdade de Comunicação,
jornalista, escritora (poeta e prosadora, com livros publicados)
e fotógrafa.
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