Alô, Mãe
            
                        "Quem forma vinha colhe uva, quem planta chuva colhe tempestade"

Alô, mãe! Opa,desculpe-me, foi engano! Onde está mesmo o número do telefone da minha mãe?
(passado algum tempo...)

— Alô, manhê, faz vários dias que tento te ligar, mas estava muito ocupado....
— Tudo bem, meu filho?
— Tudo bem sim, mãe. Correria de sempre. Muitas viagens, negócios, reuniões, trabalho, trabalho, trabalho, reuniões, amigos... Custear os filhos na escola, tudo tão caro, mãe... Eles estão sempre trocando de carro, as despesas aqui são muitas, tenho que batalhar muito, muito... Sim, mãe, o Natal foi muito bom, passamos em um hotel-fazenda, todos reunidos, os filhos, namoradas dos filhos, alguns amigos... Desculpe-me, mãe, poderia ter levado a senhora também, mas esqueci... Ah, semana passada foi seu aniversário, parabéns, mesmo um pouco atrasado, não tive tempo... mas vou pedir para minha secretária comprar a sua lembrancinha e ao meu motorista que a leve pra você... se der tempo, eu mesmo levo, porque quero lhe dar um grande abraço!
— Sei como é, meu filho...
— Tudo bem por aí, mãe? A senhora não está passando bem? É a idade, afinal, 86 anos pesam... Está recebendo a aposentadoria, mãe? Ainda um salário-mínimo? Poxa, mas como este Governo é desigual! Mas dá para você morar na Casa de Repouso, não é? Lá tem de tudo, viu, mãe? Tem médico, enfermeira, a comida não é lá essas coisas, mas dá pra tapear o estômago... Mãe, tenho que desligar, tenho um jantar com uns clientes.
— Fique com Deus, meu filho!
E o tempo passa e a vida passa...

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Alguns anos depois...
— Alô, oi, meu filho, que saudades de você! Você sumiu daqui... Eu sei, filho, não tem tempo... Ah, eu queria ir para a Casa de Repouso! Ando muito triste, não recebo visitas, estou mesmo doente, mal posso andar... Não queria ficar te incomodando, filho, você sabe que dediquei minha vida toda a vocês, fiz de tudo para lhes dar uma boa educação, saúde, estudos... Não medi esforços, nem horário... Madrugadas eram duras, cuidava de vocês sempre, mesmo com um simples resfriado...e, no dia seguinte, a luta continuava, eu tinha que trabalhar logo cedo, cuidar de vocês, da casa, costurar... você sabe...
— Sim, mãe...
— Filho, desculpe a mamãe ocupar seu tempo...sei que você tem que cuidar da sua empresa, negócios, família, amigos... Sei que sou descartável. Desculpa a mamãe estar falando isso, mas assim me sinto, preciso desabafar... Filho,vou procurar quem me leve para a Casa de Repouso...
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E o tempo passou. Envelheci. Estou, agora, numa Casa de Repouso e recebo um salário-mínimo por mês... Sei que vou morrer sozinho aqui... Ah, como eu gostaria, pelo menos, de ir àquela Casa de Repouso aonde minha mãe foi, mas sequer sei o endereço! Nunca a visitei! Pelo menos seria uma maneira de estar mais perto dela... Mãe, manhê, mãezinha! Precisamos conversar, agora tenho todo o tempo do mundo para você! Mãe, estou velho, doente, sozinho... Agora eu tenho tempo, mãe! Agora eu tenho todo o tempo do mundo, mas não tenho mais a minha mãe! Agora é tarde, o tempo não volta mais e o brilho seco dos meus olhos não exprimem toda dor e lágrimas de minha alma. Ah, como eu gostaria que meu coração falasse tudo, para que as pessoas entendessem a minha grande dor! Eu não consigo mais pensar, refletir, tudo é cinza em minha mente. Só sei ficar repetindo, repetindo, MÃE, são três letras que doem aqui dentro do meu peito! E você, se ainda não beijou sua mãe hoje, corra, dê um abraço nela, porque este gesto vai fazer bem a ela e a sua alma. Não faça como eu fiz, não espere o tempo passar, não chore amanhã de arrependimento. Corra, talvez ela esteja esperando seu último abraço.

J.G. Marchi – porque meu nome tem que ser com maiúsculas se eu sou minúsculo?

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