SACIEDADE DOS POETAS VIVOS DIGITAL - VOL. 1

ANDERSON BRAGA HORTA - nasceu em Carangola, MG, em 17.11.1934. Morou em várias localidades mineiras, no Rio de Janeiro, na cidade de Goiás e em Goiânia. Na área de Tradução, destaca: Fugitiva, de Trina Quiñones (1993), Poetas do Século de Ouro Espanhol (com Fernando Mendes Vianna e José Jeronymo Rivera, 2000), Poetas Portugueses y Brasileños de los Simbolistas a los Modernistas (colaboração, 2002), Victor Hugo: Dois Séculos de Poesia (2002, com os autores acima), Antologia Pessoal de Rodolfo Alonso (2002, com José Augusto Seabra e José Jeronymo Rivera), Traduzir Poesia (2004) e Contos de Tenetz (de Yordan Raditchkov, com Rumen Stoyanov, 2004). Seus livros Altiplano e Outros Poemas, Marvário, Incomunicação, Exercícios de Homem, Cronoscópio, O Cordeiro e a Nuvem, O Pássaro no Aquário e composições até então inéditas foram enfeixados em Fragmentos da Paixão – Poemas Reunidos (Massao Ohno, São Paulo, 2000). Além disso, publicou Dos Sonetos na Corda de Sol (EGM–Guararapes, 1999), Pulso (Barcarola, São Paulo, 2000), Quarteto Arcaico e Trinta e Três Sonetos (EGM, 2000 e 2001), Antologia Pessoal (Thesaurus, Brasília, 2001) e 50 Poemas Escolhidos pelo Autor (Galo Branco, Rio, 2003). Em prosa, pela Thesaurus: A Aventura Espiritual de Álvares de Azevedo: Estudo e Antologia (2002), Sob o Signo da Poesia: Literatura em Brasília (2003) e Testemunho & Participação: Ensaio e Crítica Literária (2005).

Contatos: bragahorta@superig.com.br
Página individual de poesia em Blocos Online
Página individual de prosa em Blocos Online


           TELEX

Discurso microcósmico

Poética

     

           Tangente

A tartaruga

Órfica

 

A TARTARUGA

Eu venho donde vem o infinito da Vida,
do crespo e ardente oceano em toda parte ondeando,
da explosão inefável
do que chamais abismo, e é tudo, e é nada,
no pulso intemporal de quanto existe
e de quanto é oculto.
Vivo porque o Mistério impõe que eu viva,
e na vaga da Vida
— sonho que vou sonhando e que me sonha —
eu beijo a mão do Arcano e o lábio do Sigilo,
e reflito no olhar, como um memento,
o olhar do que é, não sendo.

Os olhos tenho abertos
para a impressão do nimbo e do relâmpago,
da água turva e do ar claro,
do céu-mar que se abre e se desdobra
à avidez do meu nado, de meu nada.
Mas não vêem o tempo além do agora,
o segundo futuro,
próximo como o que se foi há um átimo,
e no entanto remoto
como a encoberta eternidade.

Vi o homem de gatinhas,
na semente animal ainda indiferenciado.
Ouvi seus balbucios.
Fiz minha mão a mão que fez o arado,
que faiscou na pedra um firmamento
fugaz de estrelas árdegas.
Tomei-lhe da mão trêmula
a ensaiar-se divina
no primeiro rabisco
do primeiro alfabeto,
na prisca partitura
da vindoura vertigem
de encontrar-se maior que a imensa origem.

Das figuras rupestres das cavernas
subi ao zigurate dos sumérios.
Cunhei sonhos avoengos nos ladrilhos.
Andei Índias e Chinas
do Oriente e do Ocidente.
Topei do Egito o sacro escaravelho.
De tudo em toda parte uma imagem ficou-me
gravada na retina que não vedes.

Sei do amor e do ódio,
sei do hino e do vômito,
sei da paz e da guerra,
sei do mar e da terra,
sei do céu e do éter,
sei da carne e do espírito.

Muito eu tenho vivido,
tanto amado e sofrido
e pecado e ascendido. Respeitai-me,
se não por vós, grumetes
que o Mar aleita ainda,
pela Vida que em mim se fez tempo e caminha
para fazer-se eternidade.

Que novas cores beberei? Que músicas
fluirão no meu dorso? Que suaves,
que pétreos tatos guardarei no olfato,
no paladar, na pele, na retina?

Eu continuo. Adiante!
Para onde, afinal?
Que universo, que abismo
espera por meus pés na curva do infinito?

Eu vou para onde ireis:
para Além, para o Enigma.
Eu vou para onde vai o infinito da Vida.

Prefácio
1  2 •  3 •  4  5  • 6

Anderson Braga Horta

 
Voltar à capa da Saciedade dos Poetas Vivos