GLAUCOMATOPÉIA [#18]

[1] Macho contando vantagem não é apanágio da cantoria nem do cordel: é coisa comezinha (Eu disse "comezinha"? Disse-o bem!) em qualquer tipo de poesia, em qualquer latitude, longitude, comprimento ou longevidade. Não é à toa que me arrogo algum pioneirismo neste excepcional espaço de proposta xibunguista. Voltando, porém, à vaca fria dos cabras esquentados, segue um dos muitos sonetos em que ironizo a fanfarronice varonil:

SONETO 382 MULHERENGO

A virgem deflorei quando moleque.
A puta freqüentei adolescente.
Adulto, foram muitas. De repente,
me caso, e ela me pede que não peque.

Prometo. Mas estava de pileque,
e a chance de trair é persistente,
mamão e não maçã. Haja serpente!
Agora o casamento vive em xeque.

Desejo ser fiel, mas não consigo.
As tímidas alcunham-me de Rambo;
panteras, de Bambam, mas eu não ligo.

Não pensem que sou Baco em ditirambo!
De fato aconteceu, mas não comigo:
é um cara que me conta, enquanto o lambo.

[2] No terreno da glosa, não é comum um macho confessar-se abusado por outros machos (como eu faço), mas é comum o macho lamentar a perda da potência, a queda no "desempenho", decorrente da idade -- mas mesmo assim aproveitando para recapitular as glórias do passado, ou seja, o currículo de garanhão. Eis um dos motes que abordam a questão de frente e como foi glosado, ainda no século XIX, pelo próprio Poeta Lagartixa, Laurindo Rabelo:
JÁ NÃO TENHO MAIS TESÃO,
JÁ NÃO SOU QUEM DANTES ERA!

Amor, ao teu carro em vão
Tu me pretendes jungir!
Eu não te posso servir:
JÁ NÃO TENHO MAIS TESÃO!
De putas um batalhão
Já forniquei noutra era;
Já fodi com porra fera
Mulatas, brancas e pretas;
Hoje só como punhetas,
JÁ NÃO SOU QUEM DANTES ERA!

[3] Meu assíduo colaborador Bráulio Tavares não deixou passar em branco o desafio e me brindou com duas glosas, a primeira em quadradécima e a segunda em nonadécima, ambas dentro do espírito macho-ufanista, ou cabramachista:
Casanova e Dom João
Já fui, e disso me gabo
Mas pra seduzir um rabo
Já não tenho mais tesão.
Já gostei de azaração,
De conquista, de paquera...
Mas hoje qualquer espera
Não me traz nenhum prazer...
Só quero mesmo é fuder!
Já não sou quem dantes era!

Já teve a minha caceta
Desempenhos sobre-humanos:
Já passei mais de dois anos
Cravado numa buceta!
Hoje eu entro numa greta
Murmurando "quem me dera!"
Se eu meter na primavera
Gozo antes do verão...
Já não tenho mais tesão!
Já não sou quem dantes era!

[4] Quanto a mim, abro mão provisoriamente do ideário xibunguista e também me permito uma pausa para a heterossexualidade, que ninguém é (só) de ferro...
Errados todos estão:
Fãs, leitores e demais
Biógrafos, para os quais
Já não tenho mais tesão!
Cego, calvo e cinqüentão,
Nenhum macho me paquera...
Mas, se à bela atrai a fera,
Já me ronda o mulherio!
Aos paus quase renuncio:
Já não sou quem dantes era! [8.53]
GLAUCO MATTOSO
Poeta, letrista, ficcionista e humorista. Seus poemas, livros e canções podem ser visitados nos sítios oficiais:
http://sites.uol.com.br/glaucomattoso
http://sites.uol.com.br/formattoso

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