Solange Firmino

Professora do Ensino Fundamental e de Língua Portuguesa e Literatura do Ensino Médio. Escritora, pesquisadora. Estudou Cultura Greco-romana na UERJ com Junito Brandão, um dos maiores especialistas do país em cultura clássica.

Mito em contexto - Coluna 10
(Próxima: 5/10)

A eterna juventude das ninfas

No texto “O Inverno e a renovação necessária” há uma introdução sobre a associação do mito de Deméter e Perséfone com as estações do ano. Essas deusas representavam a transformação da natureza e seu surgimento cíclico. Outros mitos também se relacionam com as estações do ano. Falando especialmente da primavera, muitas das suas representações estão associadas às ninfas.

As ninfas eram cultuadas como divindades, mas não eram imortais, nem moravam no Olimpo com os deuses. Elas habitavam na natureza, em todas as suas manifestações, como grutas, árvores, mares, lagos, bosques, montanhas, e recebiam denominações de acordo com a origem ou o local em que ficavam. Assim, entre várias ninfas, as Náiades eram as ninfas dos riachos; as Oceânidas eram filhas de Oceano e Tétis; as Nereidas eram filhas de Nereu e Dóris. Cada ninfa também tinha um nome próprio. Entre as Nereidas destacaram-se Tétis e Galatéia. As Melíades nasceram do sangue de Urano , eram as ninfas dos freixos, a árvore da vida entre os escandinavos, sagrada e indestrutível.

As ninfas eram sempre representadas como mulheres jovens e bonitas, tiveram muitos amores e geraram filhos famosos, como Aquiles, herói da guerra de Tróia, filho de Peleu e da ninfa marinha Tétis; e Orfeu, filho de Apolo com a ninfa Calíope.

Apolo é famoso por seus amores, entre eles várias ninfas, como Calíope, Dafne e Corônis. Apolo zombou das flechas de Eros, e este atingiu Apolo e Dafne. Mesmo sendo deus da medicina, Apolo não encontrou nada que curasse a flechada de amor. Dafne, atingida com a flecha da repulsa, fugiu de Apolo e pediu ajuda ao seu pai, o rio Peneu, que a transformou em loureiro. Apolo declarou amor eterno a Dafne tornando o loureiro sua árvore sagrada. Com a ninfa Corônis Apolo teve Asclépio, morto pelos raios de Zeus, após tentar alterar a ordem do mundo ao ressuscitar os mortos com sua medicina.

Quem não teve sorte no amor foi a ninfa Eco, condenada pela deusa Hera a repetir o que os outros disseram. Eco se apaixonou por Narciso, que era apaixonado pela própria imagem e nunca percebia os apelos apaixonados de nenhuma ninfa, ao contrário de Orfeu, que se apaixonou pela dríade Eurídice e foi até o Hades tentar recuperá-la depois que ela morreu.

Outra ninfa que figurou nas histórias de deuses e heróis foi Calipso, que recebeu Ulisses quando este tentava voltar para sua terra, após a longa guerra de Tróia. Calipso foi amante de Ulisses e o manteve preso em sua ilha durante anos. A pedido de Atena, mesmo contrariada, a ninfa ajudou Ulisses a construir uma jangada para continuar a viagem.

A ninfa Calisto fazia parte do cortejo de Ártemis, a deusa virgem que vivia nos bosques. Calisto devia guardar sua virgindade, mas Zeus a seduziu disfarçando-se de Ártemis. Depois de vê-la grávida, Ártemis a transformou em ursa antes de matá-la. Calisto foi transformada por Zeus na Constelação da Ursa Maior.

Como demonstra a história de Calisto, as ninfas faziam parte do cortejo de vários deuses, entre eles Dioniso, deus do vinho e da vegetação. Os sátiros também acompanhavam Dioniso e andavam atrás das ninfas dançando, bebendo e tocando músicas. Os sátiros eram as divindades das florestas, montanhas e bosques, representados com cornos e pernas de cabra. Pã, deus das florestas e rebanhos, era um sátiro considerado filho de uma ninfa.

Alguns relacionam a ninfa grega Cloris com Flora, deusa romana das sementes e dos frutos, que teve seu nome associado a tudo o que florescia. Os romanos enfeitavam casas, templos e ruas com flores durante festivais em homenagem a Flora. No mito grego de Zéfiro, o vento oeste, ele se apaixonou por Cloris e a chamou de rainha das flores, concedendo-lhe a capacidade de germinar as sementes.

A obra de Botticelli, A Primavera, pintada no século XV, apresenta em um canto da figura o vento Zéfiro junto a Cloris.

Artistas de todas épocas se inspiraram na natureza ao compor suas obras, e a s ninfas sempre foram fonte de inspiração nas artes. Muitos atributos de seres como fadas e elfos vêm das representações que sempre se fizeram das ninfas.

As ninfas não eram imortais, mas não envelheciam, suas vidas duravam enquanto duravam os lagos, as árvores e outros elementos a que estavam ligadas, simbolizando também a eterna renovação da natureza, que morre e renasce, ressurgindo em ciclos.

Agora é tempo de germinar as sementes que descansavam no inverno. Celebremos a eterna juventude das ninfas e da natureza.

Deixo aqui umas palavras minhas às ninfas que enfeitam as primaveras de todos os tempos:

Primavera,
Eu te espero
como semente que se guarda
para (re)nascer.
Como casulo
que ouve o sussurro
das trilhas que percorrerá.
Como pétala
que deseja desabrochar
e explodir em cores.
Como noite fria
que aguarda o regresso do sol.
Sou ninfa livre
que dança ao som
da flauta encantada de Pã
e se embriaga com o
vinho de Dioniso

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