Culto aos mistérios do passado
na vivência do mundo de agora

lembranças da encarnação no Sul da Índia (como Tamul Nadu) com reflexões místicas sobre sua vida atual
COLUNA QUINZENAL DE CLARISSE DE OLIVEIRA
autora do livro “Mistérios” (Ed. Europa)
Nº 28 - 23/6/2010
(próxima: 23/7/2010)

RECORDAÇÕES RECENTES E REMOTAS


RATO MORTO

Meus parentes não me ajudavam, em minha infância, na proteção aos animais.
Colecionei insônias, relembrando as tragédias que não pude evitar.
Hoje, já tenho uma vida para relembrar.
O Socorro para os inevitáveis não se transformarem em uma Floresta de Horrores, como a floresta que a Princesa Branca de Neve teve que enfrentar quando abandonada, para dissolver os Horrores que a apavoravam.
Os que nos ajudam na Vida deste Planeta, os Mestres Invisíveis, me intuíram a "Desfazer a Lembrança Horrível" - o que, quanto aos animais, como uma ilusão de Existência, é desfeito de melhor maneira, pois os Animais não têm Consciência.
Assim, a Lembrança´nossa é desfeita junto com o que possa se passar com o Animal, dando oportunidade para que o Espírito reine, dissolvendo a Ilusão e o Sofrimento, ou melhor, transformando-os na Metamorfose do que possa ser a Verdade no Espírito.
Pela manhã, quando fui abrir as largas portas que dão para a varanda, vi o corpo de uma ratazana morta, no chão, um belo animal cinza, de longo rabo fino.
O caseiro, já tinha observado que a ratazana gostava muito de uma bonequinha recheada de bolinhas de isopor e colocara comida com veneno na vitrine.
Chocada com o que acontecera, olhei para os farrapos de Céu por entre os galhos do jequitibá e orei pela Alminha da ratazana.
Meu Deus, somos tão pobres para transformar o que intuímos...

flor de lótusflor de lótusflor de lótus

DIA DE VENTO

O vento que sopra no dia quente de Sol abrazador, penetra pelos corredores dos Templos Hindús: faz dançar a fumaça dos defumadores — e não mexe com o Fogo, pois na Índia do Sul, principalmente, não são acendidas velas nos Templos, mas sim, torrões de cânfora inflamável.
As antigas Devadases equilibravam sua energia com a dança — a batida dos pés nos chãos de pedra, acompanhada no ritmo pelos mudras, o movimento dos olhos e o deslocar do pescoço, fazendo-o dançar para os lados, em um domínio completo de toda a ossatura.
Era importante que toda matéria humana estivesse embalada pelo vento, como estavam as folhas, poeira, odores, as gotas de suor, a respiração opressa...
A Devadase dançava sorrindo... porque a Energia é clara e fecundante, orgasmo da Vida...
Lá em cima, no Norte da Índia, o vento soprava frio, os sacerdotes dançavam com máscaras terrificantes...
Os tambores soavam com sinos e sons de vibrações de prata retinindo de choques dos objetos sagrados.
As grandes cornetas, estiradas desde o solo, soltavam seus lamentos lúgubres...
Os sacerdotes dançavam, com suas mascaras ameaçadoras...
Por incrível que pareça, essa dança era para despertar o Silêncio; toda ela só tinha um sentido: o Silêncio.
O Horror fazia recuar o mundo material, o som tinido da prata, era o espírito desperto; o lamento das longas cornetas, o sinal de recuo em meio a barulheira dos dançarinos...

O Budista, impávido, imóvel na sua conquista pelo centro do
                                                    Mundo
                                          Om Mani Padme Hum
O Hinduismo fazendo despencar das brumas da Criação,
o imaterial semen que faz latejar a Vida para a conquista de
                                                 Si Mesma
                                     E o Tantrismo no Himalaia
                               fazendo a Daquene solicitar ao Budismo
                                         permissão para a
                                     Doçura da Misericórdia             

flor de lótusflor de lótusflor de lótus

ELE

Ele veio de uma aldeia próxima.
Chegou ali, nas imediações de Madurai, e viu um Templo estranho: em um alpendre da frente, colunas de cavalos empinados, com deuses entre as patas que ficavam na terra, sustentavam o teto do alpendre.
O rapaz, vendedor de objetos feitos com espécie de vime, resolveu entrar no Templo.
Suas salas não eram grandes, mas havia uma atmosfera estranha; para se dizer, confusa... Ele, o rapaz, sentia na atmosfera, "cheiro de mulher"... por isso, resolveu ficar mais tempo... observando o movimento do Templo.
Em uma sala revestida com pedra, um homem sentado no chão, batia palmas e falava com uma dançarina, misturando palavras curtas com palmas, dominando o ritmo da dança.
Não havia música; só ritmo: isso era o principal.
O homem sentado no chão, viu o rapaz com os objetos de vime pendurados no ombro e fez sinal para que ele se afastasse dali.
O jovem desceu uma escada de pedra e encontrou-se em um outro alpendre, porém maior do que o de cima, na entrada do Templo: diante dele, um pátio retangular e lá ao fundo, sobre um muro que fechava o pátio, uma colina pequena, marrom, meio lage e terra.
Ele, o rapaz, estava com fome; foi quando, vindo do andar de cima, uma jovem de uns quinze anos, apareceu diante dele.  Descalça, uma roupa como um sarong, envolvia seu corpo; os cabelos enormes, fartos, caíam pelas costas, até abaixo de suas nádegas.  Os lábios eram carnudos e tingidos com suco vermelho de algum fruto. Apesar da fome, o rapaz se encantou com a moça.  Por sua vez, a moça, que nunca vira olhos tão belos como os dele, o olhava com admiração e sem saber que atitude tomar.  Por fim, estendeu-lhe um doce de sementes amassado com mel, já meio mordido. O rapaz, sorrindo, pegou o doce e o comeu, fazendo sinal para a jovem que apreciara a comida e também fazendo sinal para o estômago, que estava com fome.
A jovem, fez-lhe um aceno para que a acompanhasse e juntos, subiram uma escada no fundo da sala principal e saíram ao ar livre, diante de montanhas rochosas, baixas, arredondadas.
Em cavernas, cavadas nas rochas, existiam outros altares, e salas com frutas, cereais, melado de cana.  Com uma casca seca de fruta, a moça tirou água de um dos vasilhames e ele limpou os dedos.
Ele, então, contou que vinha de uma aldeia vizinha, ver se podia vender ali os seus objetos de vime. A moça contou que era dançarina do Templo e sua família morava um pouco adiante.
A fome satisfeita, os olhos de ônix negro do rapaz, passeavam sobre o corpo da moça.
Dela, emanava um cheiro  de óleo perfumado, suor e fêmea.
O filho do deus Shiva, Murunga, tomava conta e zelava por uma energia esparsa no recinto onde estava o altar de entrada.  Naquele Templo, fora desvendada uma energia que impulsionava A Chave da Vida, o Secreto da Existência.
Essa Energia, como Chama Invisível, mantinha a Existência na Terra, do Cosmos Universal.  Era como se fosse o Ponto G, classificado hoje na mulher, assim era o ponto G, no Espaço Universal.
Essa Energia, correspondida no Ser Humano, era um Eco do Ritmo de Shiva, o Transformador.
Quem tivesse vivido e servido nesse Templo, transformado pelo deus Shiva, seria um ser diferente, mesmo que tivesse consentido viver entre os terráqueos...
O amor despertado entre os dois jovens, rolaria retumbando pelo Espaço, alimentado pelo deus servo e vigilante do Mantenedor da Criação, o Deus do Amor, Vishnú.

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DA ÍNDIA A IPANEMA

A Baiadera do Sul da Índia, era morena, de pele resistente e macia, e, seu cabelo uma massa pesada de fios resistentes, que formavam uma nuvem compacta, como aquelas nuvens que pesavam no Céu, antes da chuva despencar em Madurai.
As pontas dos fios de seu cabelo, passeavam sobre suas nádegas, firmes e macias como o corpo dos tambores que expandiam os sons de seus batuques pelas salas dos Templos Sagrados.
Sua cintura afinada pelo ondular dos quadrís que guardavam a magia da sensualidade, estava pronta para o deslizar da mão do amante que a cingia como um aro de anel abençoado pelos deuses para os quais a baiadera dançava.
De repente, a Baiadera renascia em Ipanema, um bairro da cidade do Rio de Janeiro, e seus familiares a forçavam cortar os cabelos negros, lisos, com sangue chinês.
A Baiadera renascida, lutou por seu cabelo, mais fino, menos resistente, mas a única coisa que lhe restara dos Templos onde os deuses corriam seus dedos por entre fios, que nem os namorados que davam tanto valor aos fios perfumados pelas fumaças dos defumadores dos Altares Sagrados.
O chão quente do Tamil Nadu do Sul da Índia era-lhe um pesadelo nas noites insones, onde o fragor das ondas do Atlântico da Praia de Ipanema não conseguiam desfazer o peso da massa compacta de fios negros, que outrora ondularam-se para os deuses do Hinduismo.

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SAUDADE

Saudade,
não recupera o Mundo
Saudade,
não refaz uma perda,
porque,
Saudade,
não refaz nosso íntimo,
aquilo que sabemos e sentimos
de nossas entranhas,
que nós,
essência de Deus
que somos,
refazemos constantemente,
como o Refletido no Espelho Misterioso
                         da Criação
que não tem Início, nem Fim,
pois o Reflexo da Eternidade
embaralha os Desígnos do Destino
      que não saem das mãos de Deus.

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