JOSÉ NÊUMANNE
Jornalista, editorialista do Jornal da Tarde, comentarista da Rádio Jovem Pan e do SBT, poeta e escritor com diversos livros publicados, entre eles: Solos do silêncio – poesia reunida  e O silêncio do delator, que acaba de obter o Prêmio "Senador José Ermírio de Moraes", da ABL (clique no título da obra para ler a fortuna crítica).

Coluna de 21/07

O forró da Ilha Fiscal

Se não mudar logo de interlocutor, Lula pode ter seu “arraiá” julino comparado com a festa do fim do Império

Já no fim do depoimento do presidente nacional licenciado do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), na semana passada, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) abriu o verbo. Foi como se o relógio do tempo andasse para trás e a transmissão direta pela TV não fosse daquela, mas de outra CPI histórica: a de PC Farias. Os atores eram os mesmos, embora mais velhos: o guerreiro gaúcho atacando e o malandro carioca tentando fugir ao cerco do fogo de suas sentenças com dribles lembrando os de Garrincha.

Naquele tempo o ataque coordenado por vários oradores ilustres, como Simon, pôs termo ao mandato do primeiro presidente eleito pela vontade do povo, Fernando Collor, defendido pelo criminalista Roberto Jefferson, depois de 19 anos de imposição do almanaque do Exército. Agora, o mesmo Simon fez uma justiça ao sempre execrado carcará sanguinolento de Alagoas. Não importa se por arrogância ou por erro de cálculo, ele jamais pressionou os parlamentares na condução dos trabalhos da CPI e ainda determinou que a Polícia Federal os atendesse no que pedissem. Hoje, contudo, os petistas, que estiveram na linha de frente da deposição de Collor, apelaram para todos os truques à mão para evitar as CPIs dos Bingos (só autorizada a funcionar um ano depois por ordem do Supremo Tribunal Federal) e dos Correios. Os líderes governistas negaram-se a nomear os membros a que tinham direito e o presidente do Senado e aliado também recusou-se a indicá-los, na primeira. Na segunda, o rolo compressor oficial tentou (e não conseguiu) persuadir os signatários do requerimento da instalação a retirarem as assinaturas e abriu uma pendência na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (em vão) para evitá-la. Não descansou enquanto não impôs presidente e relator para ter certeza de que as investigações estariam sob seu controle. É fato que o presidente, senador Delcídio Amaral (PT-MS), e o relator, deputado Osmar Serraglio, dirigem o trabalho com isenção, mas não dá para negar que os articuladores federais fizeram de tudo para evitá-la. Seu malogro não lhes justifica o perdão.

No reencontro com o velho contendor do passado, o senador Pedro Simon reconheceu que o ideal seria propor de cara perdoar Roberto Jefferson sob o compromisso de que nada esconda. Na verdade, este já contou até demais, mas o gaúcho deve ter a sensação de que ele sabe ainda mais e está usando seu silêncio para calar adversários renitentes, cujo pavor se tornou evidente no interrogatório.

Com a autoridade e a respeitabilidade que recolheu em anos de probo exercício da política, o veterano senador deu a receita para o presidente Lula sair da crise: chutar o PT e seus aliados de aluguel e passar a governar diretamente para o cidadão sem intermediação política. Esta seria, de fato, uma revolução nos costumes políticos brasileiros. Pode até ser uma utopia, mas não seria tão impraticável assim, caso tivesse o presidente noção completa do atoleiro em que ele e a Nação se encontram. E demonstrasse possuir uma coragem cívica que até agora parece lhe faltar tanto à biografia quanto à personalidade.

Para tomar uma atitude desassombrada como essa, Sua Excelência teria de estar hoje mais próximo de Simon que do líder da bancada deste, Ney Suassuna (PMDB-PB), que saiu de casa e integrou-se ao depoimento de Jefferson para justificar um pecado que ora lhe pesa na biografia: foi citado pelo acusado que virou acusador por lhe haver pedido para receber um chantagista. Tão próximo dos pigmeus como poderia o presidente dar passo de gigante?

Só que se não mudar rapidamente de interlocutor e atitude, Lula poderá até se arrepender da decisão insensata de confirmar o “arraiá” da Granja do Torto no fim de semana em que a Veja publicou a prova das relações incestuosas entre a cúpula do PT e Marcos Valério. Afinal, a festa pode ficar conhecida como “o forró da Ilha Fiscal”.

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