JOSÉ NÊUMANNE
Jornalista, editorialista do Jornal da Tarde, comentarista da Rádio Jovem Pan e do SBT, poeta e escritor com diversos livros publicados, entre eles: Solos do silêncio – poesia reunida  e O silêncio do delator, que acaba de obter o Prêmio "Senador José Ermírio de Moraes", da ABL. Leia novo texto de Ronaldo Cagiano na fortuna crítica do autor e conheça a poesia do colunista, cujo CD agora tem opção de download. Site: http://www.neumanne.com

Colunas de 9/11
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O caos aéreo nacional - No ar incúria e desleixo

O governo federal previu uma verba de R$ 489,1 milhões para o programa de Proteção ao Vôo e Segurança do Tráfego Aéreo no Orçamento de 2007. Essa verba é inferior à dos orçamentos de 2005 (R$ 496,6 milhões) e 2006 (R$ 521,7 milhões) e está 22,6% abaixo do valor dado como mínimo pelo Comando da Aeronáutica, cujo chefe, o brigadeiro Luiz Carlos Bueno , foi ameaçado de demissão, apontado como bode expiatório no caos dos aeroportos e salvo da degola pela firmeza com que aplicou a disciplina militar para esvaziá-la. De fato, a situação do comandante era semelhante à de Pilatos no Credo, pois o chefe de um setor não pode ser inculpado pelas deficiências desse setor se não recebe recursos para corrigi-las. Quem ouviu as entrevistas de seu chefe civil, o ministro da Defesa, Waldir Pires, viu que o brigadeiro fez o que pôde para superar o desleixo com que o governo federal tem tratado a questão. Enquanto o ministro falou demais, mas disse pouco e deixou claro que não entende do assunto, de sua alçada.

As deficiências do sistema de controle de vôo no País, vindas à tona com a tragédia do choque ocorrido no espaço aéreo amazônico de um jatinho executivo Legacy e um Boeing de passageiros da Gol, parecem fazer falta, não apenas no acervo de conhecimentos do ministro da Defesa, mas também no das autoridades do Ministério do Planejamento que fazem o Orçamento da União. Os burocratas que cuidaram disso não tiveram a mínima idéia do que estava por vir: o caos vivido nos aeroportos brasileiros nos últimos dias por conta dessa crise. Na prática, o governo vem liberando muito menos do que está previsto no Orçamento. No ano passado, foram gastos apenas 56,3% do total orçado. Em 2006, a situação se repetiu: até o dia 26 de outubro o programa havia recebido pouco mais da metade do que se previa.


A tunga da taxa de embarque

O mais grave, contudo, é que não se trata apenas de incúria, imprevidência e falta de previsão. Trata-se de uma tunga no bolso de quem voa. Afinal, o dinheiro com que são pagos pessoal e equipamento nas operações de tráfego aéreo do Brasil não vem dos impostos escorchantes arrecadados da sociedade, mas, sim, de uma taxa de embarque cobrada nos aeroportos de todos os viajantes. Por causa da crise dos operadores, o contribuinte ficou sabendo que os recursos saídos do bolso dos passageiros que pagam a taxa não estão sendo usados em sua totalidade para pagar o que deviam e somem no saco sem fundo do Tesouro Nacional. A questão que paira no ar hoje é: o dinheiro que falta estará sendo usado em quê? Alguém aí sabe por onde anda nosso dinheirinho?


O viés sindicalista

O problema do governo Lula é que há sindicalistas demais nos escalões decisivos e tudo acaba virando negociação de salário. Quando estourou a crise dos controladores de vôo, o viés sindicalista levou os ministros da Defesa, Waldir Pires, e do Trabalho, Luiz Marinho, a correrem para a mesa de negociações com os responsáveis diretos pela confusão. Até que um subordinado do primeiro, o comandante da Aeronáutica, atacou o problema pelo lado correto: o da segurança nacional. Como a grande maioria dos controladores é de sargentos sob seu comando, o brigadeiro Luiz Carlos Bueno convocou um bom número deles e os aquartelou no Cindacta na quarta-feira, à noite, véspera da greve anunciada. No dia seguinte, a paz voltou a céus e aeroportos do Brasil.


E Lula foi vadiar

A reação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao caos nos aeroportos - esbravejou com os subordinados, esmurrou a mesa e fugiu para a praia - permite o palpite de que talvez na segunda gestão ele reforce sua porção Ascenso Ferreira. Como seu poeta e conterrâneo, o presidente pratica o "hora de comer, comer; hora de vadiar, vadiar; hora de trabalhar, pernas pro ar que ninguém é de ferro". Após exaustiva campanha, viajando do "Oiapoque à Ilha do Marajó" (para nos adaptarmos a suas metáforas de aproximação geográfica), Sua Excelência resolveu desmentir de vez a paródia do próprio marqueteiro Patinhas do lema getulista com o "deixem o homem trabalhar" para pedir votos. Pelo ocorrido no caso, teremos mais do mesmo "deixem o homem descansar".


A estrela da grande vilã

A primeira-dama, Marisa Letícia Lula da Silva, aproveitou a temporada al mare para inaugurar maiô novo com uma estrela vermelha, semelhante à que ela mandou plantar nos jardins do Palácio da Alvorada, na barriga. Além de deselegante, o maiô se transformou num mico de dimensões globais: o colunista de humor da Folha de S. Paulo associou a imagem estampada ao logotipo da Texaco, componente do clube mais detestado pela esquerda mundial, as chamadas sete irmãs, empresas multinacionais responsáveis pelo refino e distribuição da parte do leão dos derivados de petróleo no mundo globalizado. E assim a musa do Bolsa Família terminou se tornando, involutariamente, garota propaganda de uma grande vilã.


HERÓIS BRASILEIROS

Brigadeiro Luiz Carlos Bueno

Ao enquadrar os controladores militares de vôo, seus subordinados hierárquicos, o comandante da Aeronáutica arriscou o posto, pois o gesto dele pareceu uma insubordinação hierárquica. A súbita mudança de ares nos grandes aeroportos brasileiros - do caos assustador à tranqüilidade absoluta -, contudo, mostrou que, ao contrário do que apregoam os idiotas da objetividade, um pouco de rigor e disciplina militares pode funcionar para resolver problemas que a cegueira ideológica não permite perceber.

Tucana idéia de jerico

O pontapé inicial foi do senador Delcídio Amaral (PT-MS): com a boa intenção de reprimir as ações fraudulentas dos hackers que depenam contas bancárias, engendrou um sistema de controle da internet. Como sói ocorrer com idéias de jerico no Congresso Nacional, a tolice virou uma bola de neve e terminou caindo nas mãos do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), que relatou o projeto que dá aos servidores da rede mundial de computadores poder semelhante ao do Grande Irmão do assustador romance 1984 , de George Orwell. Numa prova de que a oposição também tem cotas das Organizações Tabajara, a proposta de controlar mensagens prosperou até cair na desgraça do governo. Seu congelamento é um gol de Lula.


Galinha morta é isso!

Quem pensa que o corte das verbas orçamentárias para o controle de vôo não passa de um cochilo burocrático está convidado a tomar conhecimento do levantamento que a consultoria Safras & Mercado acaba de fazer para o jornal Gazeta Mercantil . Tal levantamento calcula que o governo teria de investir este ano do mínimo de R$ 500 milhões ao máximo de R$ 1 bilhão em controle de sanidade animal. Mas só destinou R$ 100 milhões e, a pretexto das eleições (?), não gastou nem isso. Como a vigilância sanitária sobre nossos produtos pecuários de exportação é pretexto para evitar seu acesso a mercados ricos, é o caso de concluir que o governo federal se dá ao luxo de matar nossa galinha dos ovos de ouro.


E caia no frevo!

Domingo fui ver Antônio Nóbrega não remake de seu espetáculo Nove de Frevereiro , gravado em CD, vendido no foyer do teatro do Sesc Pinheiros, em São Paulo. O visual do espetáculo, por conta de Gabriel Nóbrega, filho de Toinho, e Dantas Suassuna, filho de Ariano, é maravilhoso. A orquestra de frevo de Spock, inigualável. E o artista de todos os instrumentos, que já foi spalla da Orquestra Sinfônica da Paraíba, se consagra como uma mistura de Chaplin e Câmara Cascudo da era cibernética. Quando o show vier aqui para perto, não perca, caro leitor. Pois ele está à altura de tudo o que de mais competente está em cartaz hoje em Nova York, Londres ou qualquer cidade do mundo. E igual a frevo não há!

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