Coluna de Rogel Samuel 
Rogel Samuel é Doutor em Letras e Professor aposentado da Pós-Graduação da UFRJ. poeta, romancista, cronista, webjornalista.
Site pessoal: http://literaturarogelsamuel.blogspot.com/

Nº 152 - 2ª quinzena de abril 2009
(atualização quinzenal, dias 10 e 25)


            O IGARAPÉ DO INFERNO, 10
           
 (Romance inédito)

            QUANDO, em 1876, Pierre Bataillon alcançou aquelas terras ignotas, primeiramente encontrou uma pequena aldeia Caxinauá, no temor dos Numas sujeita, na exterioridade e imobilidade do poder Númico.
            Dir-se-ia que os Numas os toleravam. Temporariamente. Mas que a qualquer momento poderiam vir, para os supliciar, exterminar.
            A aldeia Caxinauá se espremia entre os Numas. Imprevisíveis. Lá, onde só era possível encontrar seringueiros perdidos, gente ficada da expedição de 1852.
            Os Caxinauás tiveram contato com Romão de Oliveira.
            Os Numas não.
            Reagiram, violentamente.
            Desde 1847, quando Francis de Castelnau por ali passou, e os descreveu na Expedition dans les parties centrales de l'Amerique du Sud. Um raro exemplar havia na biblioteca de Pierre Bataillon.
            Também Travestin, no Le fleuve Juruá, se referia às lutas que tiveram contra os Numas.
            Em 1854, João da Cunha Correa, Diretor dos Índios, subiu o Tarauacá, descobriu o rio Gregório, o Mu, sem contato.
            Pierre Bataillon chegou em 1876.
            É o que digo, ah ah ah. Eu é que o digo!

            Naqueles anos os Numas lá não estavam.
            Passaram-se vários anos sem eles.

            Pierre estabeleceu seu domínio com facilidade, sobre terras dos pacíficos Caxinauás.
            Uma das inúmeras aldeias Caxinauás da Amazônia.

            Pierre impôs a paz. A ordem. Destruiu a cultura Caxinauá pela raiz, novo deus que era. Eles se submeteram sem reclamos. Quase alegres.

            As mulheres e os rapazes Caxinauás se transformam em objetos do Seringal. Submetidos pela força da tropa de guerra do Coronel.
            A pequena aldeia, empestada de tifo, malária, sarampo e sífilis, quase desapareceu: uma epidemia de gripe, em 1891, dizimou um terço da sua população.

            Os Caxinauás se reduziram a 84 viventes agricultores.
            Ah, ah, ah... – mas..

            Dez anos depois, porém, voltaram os Numas, os escrotos, dos mistérios das montanhas peruanas. Onde para sempre se escondiam.

            O quadro se modificou.
            Com os Numas não!

            Arredios, móveis, vigilantes, foragidos, perdidos, livres, Eles impuseram a resistência e a Lei!

            Não e não!

            Reagiram ao pacto, ao toque, ao contato.
            Pois onde há resistência, há poder.

            Os Numas se submetiam a si mesmos, refugiavam-se em si. Na multiplicidade de seus pontos de força, insistindo em ser invisíveis, imprevisível, no espaço do mundo amazônico.

            Filhos de puta! Estavam em toda a parte. Mas ninguém os via!
            Lá, na exterioridade do poder do Seringal. Lá, na rede florestal.

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