Coluna de Rogel Samuel 
Rogel Samuel é Doutor em Letras e Professor aposentado da Pós-Graduação da UFRJ. poeta, romancista, cronista, webjornalista.
Blog pessoal: http://literaturarogelsamuel.blogspot.com/

Nº 307
2ª quinzena de novembro de 2016
(atualização quinzenal, dias 10 e 25)

COMO CRIAR O PRAZER DE LER

Borges escreveu sobre a poesia, sobre o rio, sobre o tempo, o recordar, a perda de nós mesmos, a lembrança de antigos rostos que passaram, que se foram na vigília da velhisse, que sonha não sonhar, e teme a morte do esquecer, de perder o precioso sonho, dos símbolos dos dias dos anos, do transformar tudo na poética da música, do rumor shakespeariano no símbolo e na morte do ver o sonho, e decadência de ter o ocaso de um triste ouro... tal é a poesia, a sua poesia, a poesia que é imortal e pobre, a que retorna ao princípio e o ao fim, como aurora e como ocaso, pois às vezes pelas tardes aparece um certo rosto que nos contempla daquele fundo de passado, daquele fundo de espelho, sim, a arte deve ser como um espelho, como esse espelho que nos reflete e nos revela o nosso próprio esquecer...
E diz mais Borges que o que significa chorar diante de Ítaca é por ver “verde e humilde”, como simples volta à casa paterna do poetar, da recordação do passado literário, “a arte é essa Ítaca de verde eternidade, sem prodígios”, o que passa, o que fica, o inconstante que é o mesmo sendo outro, o que se reescreve, ou copia, ou recria, o rio interminável do recomeçar, do recopiar do fitar o rio, feito de símbolos do passado, do passado da poética desde Ulisses, de que é feito do tecido de Penélope, que passa e se refaz e é um cristal onde na literatura nos vemos e nos perdemos, onde a morte é nosso sonho, e a vida o medo de sonhar, o passageiro das sombras, o inconstante do tempo, o interminável inconstante do tempo, de ver no ocaso um triste ouro, ouro do choro do amor ao divisar sua Ítaca, pois a poesia passa e fica no cristal de si mesma que é Heráclito inconstante ou o igual que é o outro daquele rio interminável...

Arte Poetica

Mirar el río hecho de tiempo y agua
y recordar que el tiempo es otro río,
saber que nos perdemos como el río
y que los rostros pasan como el agua.
Sentir que la vigilia es otro sueño
que sueña no soñar y que la muerte
que teme nuestra carne es esa muerte
de cada noche, que se llama sueño.
Ver en el día o en el año un símbolo
de los días del hombre y de sus años,
convertir el ultraje de los años
en una música, un rumor y un símbolo,
ver en la muerte el sueño, en el ocaso
un triste oro, tal es la poesía
que es inmortal y pobre. La poesía
vuelve como la aurora y el ocaso.
A veces en las tardes una cara
nos mira desde el fondo de un espejo;
el arte debe ser como ese espejo
que nos revela nuestra propia cara.
Cuentan que Ulises, harto de prodigios,
lloró de amor al divisar su Itaca
verde y humilde. El arte es esa Itaca
de verde eternidad, no de prodigios.
También es como el río interminable
que pasa y queda y es cristal de un mismo
Heráclito inconstante, que es el mismo
y es otro, como el río interminable.

Jorge Luis Borges

________
Arquivo de crônicas anteriores:
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48 , 49, 50, 50ext, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 6566, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74 , 75, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 94, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101, 102, 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 112, 113, 114 , 115 , 116, 117, 118, 119, 120, 121, 122, 123, 124, 125, 126, 127, 128, 129, 130, 131132, 133, 134 , 135, 136, 137, 138, 139, 140, 141, 142, 143, 144 , 145, 146, 147, 148, 149, 150 , 151, 152 , 153, 154, 155, 156, 157, 158, 159, 160, 161, 162 , 163, 164, 165, 166, 167, 168, 169, 170, 171, 172, 173, 174, 175, 176, 177, 178, 179, 180, 181, 182, 183, 184, 185, 186, 187, 188, 189, 190, 191, 192, 193, 194, 195, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209, 210, 211, 212, 213, 214, 215, 216, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 223, 224, 225, 226, 227, 228229, 230, 231, 232, 233, 234, 235, 236, 237, 238, 239, 240, 241, 242, 243, 244, 245, 246, 247, 248, 249, 250, 251, 252, 253, 254, 255, 256, 257, 258, 259, 260, 261, 262, 263, 264, 265, 266, 267, 268, 269, 270, 271, 272, 273, 274, 275, 276, 277, 278, 279 , 280, 281, 282 , 283 284, 285, 286, 287, 288, 289, 290, 291, 292, 293, 294, 295, 296, 297, 298, 299, 300, 301, 302, 303, 304, 305, 306

Conheça o "NOVO MANUAL DE TEORIA LITERÁRIA" (6ª ed., Editora Vozes) e "O AMANTE DAS AMAZONAS", 2ª EDIÇÃO, EDITORA ITATIAIA: este romance, baseado em fatos reais, históricos, conta a saga do ciclo da borracha, do apogeu e decadência do vasto império amazônico na maior floresta do mundo. Cerca de cem volumes da época foram lidos e mais de dez anos de trabalho necessários para escrever esta obra. CLIQUE AQUI PARA LER ONDE VOCÊ PODE ENCONTRAR O ROMANCE DE ROGEL SAMUEL.

Voltar